TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

399 acórdão n.º 362/15 destes pela forma prevista num plano de insolvência que, nomeadamente, se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente”. Ao fazer confluir todos os processos executivos e credores numa execução universal, onde a própria Adminis- tração Fiscal, despojada dos privilégios conferidos pelo processo de execução fiscal, concorre como qualquer credor, o objetivo do legislador é o da satisfação dos interesses dos credores, na garantia do seus créditos. Interesses estes que se centram em acautelar “o pagamento dos respetivos créditos, em condições de igualdade quanto ao prejuízo decorrente de o património do devedor não ser, à partida e na generalidade dos casos, suficiente para satisfazer os seus direitos de forma integral”. Para alcançar este objetivo e evitar perturbações no processo, o legislador estabelece que, entre a data da sen- tença da insolvência e o decurso do processo, ocorre a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor (artigo 100.º do CIRE). Trata-se, por conseguinte, de uma regra que não é especialmente dirigida às dívidas tributárias, tendo, pelo contrário, um conteúdo genérico, porque aplicável a todos os credores, com vista a possibilitar que todos possam ser pagos pelo produto da massa insolvente, em condições de igualdade e proporcionalidade, através da avocação dos respetivos processos ao da insolvência. Ora, reconhecendo o próprio legislador a incerteza quanto à possibilidade de satisfação dos direitos de todos os credores e, por conseguinte, a eventual inutilidade da avocação dos processos, por eventual insuficiência da massa insolvente, não seria legítimo que corresse contra os mesmos o prazo de prescrição, como aconteceu, aliás, no caso dos autos. Deriva de um princípio geral, acolhido no artigo 321.º, n.º 1, do Código Civil, que “A prescrição suspende-se durante o período de tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito”. E este princípio, que é um corolário do princípio geral da boa-fé, princípio basilar da ordem jurídica, igualmente válido no direito tribu- tário, encontra a sua razão de ser na natureza do instituto da prescrição. Na verdade, a prescrição assenta na necessidade de pôr termo à incerteza dos direitos e na presunção de aban- dono do titular. O seu objetivo é dar por extinto um direito que, ao não ser exercido no prazo fixado, se presume ter sido abandonado pelo titular, relevando a negligência real ou presumida do mesmo (Maria Fernanda Maçãs, “A Caducidade no Direito Administrativo: Breves considerações”, Separata de Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2005, p. 123). Assim sendo, se em situações como as dos autos, em que um credor, em homenagem aos interesses da insol- vência, é colocado numa situação em que é obrigado a abrir mão dos processos de execução fiscal, ainda assim corresse contra ele o prazo de prescrição, teríamos uma solução contrária aos mais elementares princípios da justiça e da boa-fé. No contexto apontado, o mencionado artigo 100.º do CIRE tem de ser encarado como estabelecendo uma regra específica de suspensão do prazo de prescrição, apenas aplicável aos credores (ainda que a todos) colocados numa situação especial, isto é, que vejam os seus processos executivos avocados a um processo de insolvência, valendo a suspensão durante o período que vai da data da declaração de insolvência até ao termo do processo, nos termos do fixado no artigo 230.º do CIRE (Refere o mencionado preceito que o juiz encerra o processo, designa- damente, “Quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente” [n.º 1 alínea d) ].). Em face do exposto, o sentido e o alcance do artigo 100.º do CIRE têm de ser entendidos na sua preordenação à satisfação estrita dos interesses da insolvência, que coenvolve, além do interesse prevalecente dos credores, na satisfação célere e eficiente dos seus créditos, relevantes interesses públicos e do próprio insolvente, na medida em que “[s]endo a garantia comum dos credores o património do devedor, é aos credores que cumpre decidir quanto à melhor efetivação dessa garantia, e é por essa via que, seguramente, melhor se satisfaz o interesse público da pre- servação do bom funcionamento do mercado”. Na verdade, como se pode ler no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, “[q]uando na massa insolvente esteja compreendida uma empresa que não gerou os rendimentos necessários ao cumprimento das suas obrigações, a melhor satisfação dos credores pode passar tanto pelo encerramento da empresa como pela sua manutenção em

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