TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
379 acórdão n.º 360/15 senhorio, para sua habitação ou dos seus descendentes em 1.º grau, quando o arrendatário, à data da entrada em vigor da Lei n.º 31/2012, se mantivesse no local arrendado há 30 anos. Diga-se desde já, que a referência às circunstâncias processuais não oferece, no plano em análise, relevo valorativo. B. Enquadramento 7. Para melhor apreciar a questão sub judicio , impõe-se ter em atenção a evolução legislativa que condu- ziu à normação sindicada. 7.1. No âmbito do arrendamento para habitação – o único que aqui importa considerar – o Código Civil estabelece regra especial, ao estipular no artigo 1095.º que “[n]os contratos de arrendamento a que esta secção se refere o senhorio não goza do direito de denúncia, considerando-se o contrato renovado se não for denunciado pelo arrendatário nos termos do artigo 1055.º”. Trata-se de solução normativa que remonta ao período de crise habitacional subsequente à Primeira Grande Guerra, sendo originariamente consagrada como transitória, por se traduzir num claro desvio ao princípio da liberdade contratual. Porém, foi sucessivamente mantida em vigor, até que aquele diploma codificador a acolheu como definitiva (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, vol. II, 2.ª edição, p. 513). O princípio de prorrogação obrigatória ou automática – também designado de renovação automática do contrato –, vértice do arrendamento vinculístico, visou conferir estabilidade à posição jurídica do locatário, e proteger duradouramente o seu núcleo habitacional, permitindo, uma vez findo o prazo convencionado ou supletivamente fixado na lei, impor ao senhorio a renovação do contrato, unilateral e discricionariamente. A denúncia ad nutum era, pois, um direito exclusivo do arrendatário. No artigo 1096.º do Código Civil, logo na sua versão originária, permitiu-se, porém, a denúncia fun- damentada do contrato de arrendamento por parte do senhorio. Um dos fundamentos previstos era, precisa- mente, a de posições conflituantes entre dois direitos da mesma natureza – o direito à habitação do arrendatário e o direito de habitação do senhorio – acolhendo-se na alínea a) do n.º 1 do preceito, o direito de denúncia do senhorio “quando necessite do prédio para sua habitação ou para nele construir a sua residência”. Encontra-se, também neste ponto, uma linha de continuidade com o ordenamento civil anterior. O direito de denúncia do contrato fundada na necessidade de habitação do senhorio remonta às Ordenações, acolhendo- se igualmente na Lei n.º 2030, de 22 de junho de 1948, até vir a transitar para o Código Civil de 1966. 7.2. A vigência do preceituado no artigo 1096.º foi, note-se, objeto de suspensão, por via do Decreto-Lei n.º 155/75, de 25 de março, disciplina que, por seu turno, sofreu restrição com o Decreto-Lei n.º 583/76, de 22 de julho, culminando com a revogação de ambos os diplomas, e retoma da solução normativa original, de acordo com o Decreto-Lei n.º 293/77, de 20 de julho (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit. , p. 516). Seguiu-se, cerca de dois anos depois, a Lei n.º 55/79, de 15 de setembro, dela decorrendo fortes limita- ções ao direito de denúncia facultado ao senhorio pela alínea a) do n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil, ditadas fundamentalmente por preocupações de proteção do inquilino «mais carecido [do que o senhorio] do amparo da lei» (Acórdão n.º 569/08), estatuindo nomeadamente que o direito não poderia ser exercido quando se verificasse que o arrendatário se mantinha no local arrendado 20 anos ou mais, nessa qualidade [artigo 2.º, n.º 1, alínea a) , da Lei n.º 55/79, de 15 de setembro]. 7.3. Com o Regime de Arrendamento Urbano (doravante RAU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, passou a acolher-se, a par da renovação automática e obrigatória do contrato de arren- damento para habitação, com exceção dos contratos de duração limitada em que as partes estipulavam um prazo para a duração efetiva do contrato, a denúncia do senhorio fundamentada na necessidade do prédio
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