TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

378 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL II – Fundamentação A. Delimitação do objeto do recurso 6. O presente recurso decorre de impulso obrigatório do Ministério Público, o qual versa decisão de recusa de aplicação de norma interpretativamente extraída do artigo 28.º da Lei n.º 6/2006, de 17 de feve- reiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, num dado sentido, notando-se a correspondência integral entre a formulação que consta do requerimento de interposição de recurso e o segmento final da sentença recorrida, transcrito supra, em que se enuncia a interpretação normativa desapli- cada, por inconstitucional. Com efeito, o tribunal a quo considerou o disposto na Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, imediatamente aplicável à verificação dos pressupostos do direito de denúncia pelo senhorio exercido na presente ação – interposta antes da edição do diploma –, na parte em que procede à alteração do regime estipulado nos artigos 26.º e 28.º da Lei n.º 6/2006, de 17 de fevereiro, estando em causa um contrato de arrendamento para habitação celebrado antes da vigência da RAU e decorrido o facto impeditivo do direito de denúncia integralmente no domínio da lei antiga [artigo 107.º, n.º 1, alínea b) , do RAU, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 329-B/2000, de 22 de dezembro, aplicável ex vi artigo 26.º, n.º 4, alínea a) , da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro – versão originária]. E, com fundamento em violação de parâmetros constitu- cionais consagrados nos artigos 2.º e 18.º, n.º 3, da Constituição, formulou juízo de desaplicação da lei nova. Acontece que tal juízo é referido tão somente ao disposto no n.º 2 do artigo 28.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, mas o sentido normativo que se entendeu aplicável – de acordo com entendimento do direito infraconstitucional que não cabe a este Tribunal sindicar –, e rejeitar por desconforme com a Constituição, não emerge dessa disposição, como avulta, aliás, quer da fundamentação da decisão recorrida, compreendida na sua globalidade, quer das alegações apresentadas neste Tribunal pelo recorrente. De facto, a nova regulação introduzida pelas alterações de redação operadas pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, das quais se considerou resultar que o arrendatário que se manteve no local há 30 anos ou mais, deixava de poder invocar essa circunstância como facto impeditivo do direito de denúncia do senhorio, em ação de despejo pendente à data da entrada em vigor daquele diploma, resulta da modificação operada em 2012 no artigo 26.º, n.º 4, alínea a) , da Lei n.º 6/2006, de 17 de fevereiro, na medida em que passou a remeter apenas para a alínea a) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU, e não também, como se dispunha até então, para a alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU, ou seja, para a norma que habilitava os inquilinos a preva- lecerem-se da manutenção no local arrendado por 30 anos ou mais, obstando com esse fundamento à livre iniciativa de denúncia do contrato do senhorio, para sua habitação ou dos seus descendentes em 1.º grau. O artigo 28.º da Lei n.º 6/2006, de 17 de fevereiro, é, por seu turno, convocado como sede definidora do âmbito de aplicação da lei nova, o que resulta da remissão que no seu n.º 1 é feita para o (novo) artigo 26.º, sem que para tal contribua por qualquer forma o disposto no n.º 2 do preceito. Com efeito, nele se esta- tui que “[a] os contratos referidos no número anterior não se aplica o disposto na alínea c) do artigo 1101.º do Código Civil”, o que remete para âmbito de regulação diverso, a saber, a antecedência da comunicação da denúncia ao arrendatário pelo senhorio. Temos, então, que a referência na decisão recorrida ao n.º 2 do artigo 28.º da Lei n.º 6/2006, de 17 de fevereiro, deve ser tida como lapsus calami, o qual afetou igualmente o requerimento de interposição de recurso, querendo o recorrente na realidade aludir ao n.º 1 do mesmo preceito, na redação conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto. A que junta, como se viu, face ao sentido enunciado, a necessidade de explici- tar na questão colocada a conjugação daquele preceito com o disposto no artigo 26.º, n.º 4, alínea a) , da Lei n.º 6/2006, de 17 de fevereiro, também na redação da Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto. Nestes termos, a questão a apreciar reside na conformidade constitucional da norma constante dos artigos 26.º, n.º 4, alínea a) , e 28.º, n.º 1, da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, no sentido de não impedir a denúncia do contrato de arrendamento pelo

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