TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

353 acórdão n.º 345/15 fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defenderse das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, Coimbra, 2005, p. 363). É esse o limitado alcance da norma do n.º 10 do artigo 32.º da CRP, tendo sido rejeitada, no âmbito da revisão constitucional de 1997, uma proposta no sentido de se consagrar o asse- guramento ao arguido, “nos processos disciplinares e demais processos sancionatórios”, de “todas as garantias do processo criminal” (artigo 32.º-B do Projeto de Revisão Constitucional n.º 4/VII, do PCP; cfr. o correspondente debate no Diário da Assembleia da República , II Série RC, n.º 20, de 12 de setembro de 1996, pp. 541 a 544, e I Série, n.º 95, de 17 de julho de 1997, pp. 3412 e 3466). Mas, como se reconheceu nesse Acórdão n.º 659/06, é óbvio que não se limitam aos direitos de audição e defesa as garantias dos arguidos em processos sancionatórios, mas é noutros preceitos constitucionais, que não no n.º 10 do artigo 32.º, que eles encontram esteio. É o caso, desde logo, do direito de impugnação perante os tribu- nais das decisões sancionatórias em causa, direito que se funda, em geral, no artigo 20.º, n.º 1, e, especificamente para as decisões administrativas, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP. E, entrados esses processos na ‘fase jurisdicio- nal’, na sequência da impugnação perante os tribunais dessas decisões, gozam os mesmos das genéricas garantias constitucionais dos processos judiciais, quer diretamente referidas naquele artigo 20.º (direito a decisão em prazo razoável e garantia de processo equitativo), quer dimanados do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP), sendo descabida a invocação, para esta fase, do disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.”» Não ocorre, por conseguinte, violação do artigo 32.º, n. os 1 e 10, da Constituição. 15. A convocação do artigo 269.º, n.º 3, da Constituição também não aporta qualquer dimensão de relevo. Deste preceito resulta apenas a vigência, no âmbito do processo disciplinar, das garantias de audiência e defesa, as quais, aliás, decorreriam já do disposto no n.º 10 do artigo 32.º, o que não significa a consagra- ção, neste domínio, de um direito ao recurso em termos análogos ao que se verifica em processo penal. Fora do processo penal, algumas vozes têm considerado como incluído no princípio do Estado de direito democrático o direito ao recurso de decisões que afetem direitos, liberdades e garantias constitucio- nalmente garantidos. Vejamos, a propósito deste aspeto, a impressiva síntese feita no Acórdão n.º 44/08: «Importa saber o que está em causa quando se fala em direito ao recurso. A propósito do processo civil, ensinava Paulo Cunha ( Processo Comum de Declaração , 2.º Vol., pp. 368 e 376 e segs., edição de 1944, de Augusto Costa) que os recursos são os meios de impugnação da sentença que consistem em se procurar a eliminação dos defeitos da sentença injusta ou inválida por devolução do julgamento a outro órgão da judicatura hierarquicamente superior, ou em se procurar a correção de uma sentença já transitada em julgado. Tal noção geral de recurso é igualmente recebida no âmbito do processo penal (vide Germano Marques da Silva, em Curso de Processo Penal , III, p. 301, da edição de 1994, da Verbo). “A impugnação das decisões satisfaz um interesse da parte prejudicada, que assim pode obter a correc- ção de uma decisão que lhe é desfavorável. Aquela impugnação também corresponde aos interesses gerais da comunidade, porque a eliminação de decisões erradas ou viciadas não só combate os sentimentos de segurança e injustiça, como favorece o prestígio dos tribunais e a uniformização jurisprudencial. (…) A impugnação da decisão perante um tribunal de hierarquia superior assenta no pressuposto de que aquele tribunal se encontra em melhores condições de apreciar o caso sub iudice do que o tribunal recorrido. Tal deve-se, entre outros fatores, quer à experiência e maturidade dos juízes que o compõem, quer à colegialibilidade dos tribunais superiores (por oposição ao tribunal singular que opera na primeira instância), quer ainda à concentração dos

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