TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

295 acórdão n.º 313/15 DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido pelas seguintes ordens de considerações. 1. Em primeiro lugar, tratando-se de recurso de constitucionalidade interposto pelo Ministério Público no quadro das funções próprias que lhe são constitucionalmente conferidas (artigo 224.º, n.º 1), nunca poderia invocar-se a ausência de interesse processual por parte do recorrente nem discutir-se a utilidade da decisão a proferir pelo Tribunal Constitucional em função do carácter instrumental do recurso. O interesse processual traduz-se no exercício de uma competência própria em defesa da legalidade, que integra uma forma de contencioso objetivo (artigo 202.º, n.º 2, da Constituição), e que não se confunde com as posições substantivas que constituem objeto do litígio e as partes pretendem dirimir no processo. A utilidade concreta do recurso é realizada, por sua vez, pelo reconhecimento, através de um juízo de incons- titucionalidade, da incompetência da Secção do Contencioso Tributário do STA para apreciar o recurso excecional de revista a que se refere o artigo 150.º do CPTA. É irrelevante que o tribunal recorrido, no caso concreto, não tenha admitido a revista por inverificação dos respectivos pressupostos processuais, porquanto o efeito jurídico que se pretende obter através do recurso de constitucionalidade é de diferente natureza e destina-se a impedir a própria intervenção da Secção do Contencioso Tributário do STA na apreciação do recurso de revista. E essa decisão, para além de corresponder ao interesse processual do recorrente, tem uma efetiva resso- nância no processo na medida em que a decisão recorrida teria de ser reformada por forma a que o tribunal a quo se declarasse incompetente, por falta de suporte legal, para conhecer da revista. Não tem qualquer cabimento afirmar que, mesmo que fosse formulado um juízo de inconstituciona- lidade, o resultado processual seria sempre idêntico, culminando com o não conhecimento do objeto do recurso de revista e a imodificabilidade da decisão do Tribunal Central Administrativo do Sul. Essa conse- quência processual, no ponto em que não se reflete na decisão de mérito, seria determinante para impedir o prosseguimento do recurso de constitucionalidade quando este fosse interposto por qualquer dos sujeitos que intervêm no processo na qualidade de demandante ou de demandado, caso em que o recurso não teria uma utilidade efetiva. Mas não é essa seguramente a hipótese dos autos. O recurso de constitucionalidade tem utilidade, não porque possa interferir na solução jurídica do caso concreto – questão que apenas interessa às partes – mas porque visa verificar o critério legal de competência judiciária do tribunal que proferiu a decisão recorrida. 2. Em segundo lugar, não existe nenhum motivo para considerar verificado o incumprimento do ónus de prévia suscitação da questão de constitucionalidade. OMinistério Público suscitou a questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido nos seguin- tes termos: Neste contexto deve ser recusado o conhecimento do objeto do recurso, com fundamento na inconsti- tucionalidade das normas constantes do artigo 24.º, n.º 2, do ETAF 2004 aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, e do artigo 150.°, n.º 1, do CPTA, na interpretação segundo a qual a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo é competente em razão da matéria para o conhecimento de recurso de revista interposto de acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, por violação da reserva de competência relativa da Assembleia da República sobre organização e competência dos tribunais [artigo 165.º, n.º 1, alínea p) , da CRP numeração RC/97]. O recorrente identificou, deste modo, uma interpretação normativa que é extraída dos artigos 24.º, n.º 2, do ETAF e 150.º, n.º 1, do CPTA, e que é suscetível de ser generalizada a todas as outras situações em que a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo intervenha na apreciação de um recurso de revista.

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