TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
266 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. O magistrado do Ministério Público junto do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães interpôs recurso para este Tribunal da sentença proferida por aquele tribunal, em ação especial de despejo, que considerou inconstitucional e consequentemente desaplicou os preceitos dos artigos 26.º, n.º 4, alínea a) , e 28.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhes foi dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto. Entendeu o tribunal que aqueles preceitos, interpretados no sentido de abrangerem os casos em que tenha decorrido integralmente, no domínio da versão originária do citado artigo 26.º, n.º 4, e da alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do Regime do Arrendamento Urbano (doravante, RAU), o tempo de permanência do arrendatário, ofendem «os princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança». Em causa estava um litígio entre A. e B. e esposa, C., tendo por objeto um imóvel de propriedade do primeiro, arrendado aos segundos. Pretendia o proprietário, alegando sê-lo há mais de três anos, não possuir outro prédio para habitação no concelho em causa ou noutro limítrofe e necessitar do imóvel arrendado para sua habitação própria, denunciar aquele contrato de arrendamento, conforme comunicação feita aos inquilinos por carta registada com aviso de receção datada de 27 de novembro de 2012. Os arrendatários deduziram oposição, invocando a inconstitucionalidade do procedimento especial de despejo aprovado pela Lei n.º 31/2012, por violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva plasmado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), acrescentando que à data da publicação daquele diploma legal se havia já consolidado na sua esfera jurídica o direito de oposição à denúncia do arrendamento por parte do senhorio previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU, uma vez que tinham já decorrido trinta anos desde a celebração do contrato. Sustentaram ainda os arrendatários que as normas dos artigos 26.º, n.º 4, alínea a) , e 28.º da Lei n.º 6/2006, com redação que lhes foi dada pela Lei n.º 31/2012, se interpretadas no sentido de abrange- rem os casos em que já decorrera integralmente, no domínio da lei antiga, o tempo de permanência do IV – O Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre situação similar, a propósito das disposições conti- das na alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU, na sua versão originária, e do artigo 2.º, n.º 1, alínea b) , da Lei n.º 55/79, de 15 de novembro – lei que exigia um período de permanência de apenas vinte anos no imóvel arrendado para que o inquilino pudesse opor-se à denúncia –, tendo o Tribunal julga- do inconstitucional a norma da alínea b) do artigo 107.º do RAU, quando interpretada no sentido de abranger os casos em que já decorrera integralmente, no domínio da lei antiga [a dita Lei n.º 55/79], o tempo de permanência do arrendatário, indispensável, segundo essa lei, para impedir o exercício do direito de denúncia pelo senhorio. V – Essa jurisprudência mantém total atualidade e a identidade de razões justifica a sua aplicação ao caso aqui em apreço, havendo que julgar inconstitucional a norma sub iudicio , por violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, integrantes do princípio do Estado de direito demo- crático contido no artigo 2.º da Constituição.
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