TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
253 acórdão n.º 273/15 destinatários. O princípio da proibição de excesso postula que entre o conteúdo da decisão do poder público e o fim por ela prosseguido haja sempre um equilíbrio, uma ponderação e uma “justa medida” e encontra sede no artigo 2.º da Constituição. O Estado de direito não pode deixar de ser um «Estado proporcional»” (cfr. o Acórdão n.º 387/12). No caso sub iudicio , não se questiona nem a adequação nem a necessidade da solução legal para a consecução dos fins que a mesma visa realizar (cfr., no mesmo sentido, o Acórdão n.º 383/12): a prova assente nas declarações fiscais é tida como adequada e necessária à realização dos interesses identificados no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 153/2008, de 6 de agosto. Relativamente ao teste da justa medida, importa atender, considerando a liberdade de conformação do legislador, ao critério formulado no Acórdão n.º 530/08: existe excesso, neste contexto, se se puder concluir que a norma em causa determina, para a generalidade de situações, que o interessado se veja constrito à impossibilidade de uma real defesa dos seus direitos ou interesses em conflito (cfr. supra) . Ora, como se verificou acima, no tipo de situações aqui em causa, o interessado só fica impossibilitado de uma real defesa dos seus direitos – a indemnização pela perda de capacidade de obter um rendimento equivalente ao seu rendimento mensal real à data do acidente –, se tiver declarado para efeitos fiscais um rendimento diferente (inferior) do efetivamente auferido. E esta é uma circunstância que o interessado controla, desde logo no momento de apresentação das declarações de rendimentos (mas também poste- riormente, por via da entrega de declarações retificativas). Com efeito, se a declaração não corresponder à verdade, tal deve-se, em princípio, e sem prejuízo da possibilidade de retificação posterior, à própria vontade do declarante, que pretende retirar benefícios ilegítimos da sua omissão declarativa. Ou seja, na generalidade de situações o interessado não fica impossibilitado de exercer uma real defesa dos seus direitos; aliás, tal impossibilidade poderá ser uma consequência direta da violação de deveres de cidadania fiscal. Atenta a importância de tais deveres, não é excessivo que o legislador associe ao respetivo incumprimento outras consequências com projeção noutros domínios, como sejam o plano da própria justiça comutativa (relações lesante-lesado). Tal consideração afigura-se especialmente pertinente em todos aqueles casos em que tenha de ser o Fundo de Garantia Automóvel a garantir a obrigação de indemnização (cfr. o artigo 47.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto). Excessivo seria, isso sim, assegurar ao infrator um duplo benefício económico, em prejuízo da comunidade: obrigações tributárias de valor inferior ao devido e uma indemnização superior ao rendimento declarado. v. Contudo, e tal como comecei por referir, estas conclusões não chegam para afastar a objeção quanto à não inconstitucionalidade material fundada no princípio da igualdade. Com efeito, como se disse no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 546/11: «[É] ponto assente que o n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque inte- grantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto – e veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 232/03, disponível em www.tribunalconstitucional.pt – que o carácter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, “racionais”. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do “merecimento” – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face a ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador. Fora destas circunstâncias, e, nomeada- mente, sempre que estiver em causa a simples verificação de uma menor “racionalidade” ou congruência interna
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=