TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

251 acórdão n.º 273/15 e segurados, evitando o foco de litigância que surge associado à dissemelhança de valores que estas situações comportam. A introdução desta regra contribui igualmente para que nestas matérias exista mais objetividade e previsibilidade nas decisões dos tribunais, criando também condições para que a produção de prova seja mais fácil e célere e a decisão mais justa.» São, por conseguinte, vários os interesses prosseguidos por esta alteração legislativa, todos eles com assinalável relevância constitucional: – Diminuição da litigiosidade e consequente alívio dos tribunais (artigos 20.º, n.º 4, e 202.º); – Aumento da celeridade processual, por via da facilitação da prova dos danos patrimoniais em causa (artigo 20.º, n.º 4); – Maior objetividade e previsibilidade nas decisões dos tribunais (artigo 20.º, n.º 4); – Reforço de uma “ética de cumprimento fiscal” (artigos 103.º e 104.º). iii. Importa recordar que está em causa a comprovação de um tipo de factualidade que respeita pessoal- mente ao interessado, é necessariamente do seu conhecimento direto e sobre a qual o mesmo já se pronunciou por escrito com o dever de dizer a verdade: os rendimentos líquidos por si auferidos numa determinada data passada – aquela em que ocorreu o acidente de viação – que se encontrem fiscalmente comprovados, uma vez cumpridas as obrigações declarativas relativas àquele período, constantes de legislação fiscal. Tal comprovação faz-se mediante a apresentação da declaração fiscal de rendimentos. Como sublinhado pelo Tribunal noutras circunstâncias, nomeadamente no citado Acórdão n.º 530/08, não pode deixar de reconhecer-se que um regime legal deste tipo, ao circunscrever a prova a produzir apenas à de natureza documental, é, em regra, suscetível de garantir ao interessado a demons- tração dos seus rendimentos, visto que as declarações de rendimentos a entregar perante o serviço de finanças, que apresentam sempre um suporte documental, fornecem normalmente uma indicação sufi- cientemente precisa do nível dos respetivos proventos económicos. Por outro lado, a mesma opção legislativa tem certamente por base a consideração de que os meios de prova documentais são os que se apresentam como possuindo maior eficácia e fiabilidade de que quaisquer outros e que são também os que melhor se compadecem com a celeridade processual. Em especial, no caso das declarações fiscais, a respetiva obtenção não se mostra nem difícil nem excessivamente onerosa: as mesmas encontram-se ao dispor dos interessados, por respeitarem a declarações pessoais que decorrem do cumprimento de deveres fiscais, podendo ser obtidos, por isso, sem grande dificuldade. Saliente-se, por fim, a cautela do legislador ao limitar a limitação probatória aos casos em que já foram cumpridas as obrigações declara- tivas relativas ao período em que ocorreu o acidente, prevenindo, desse modo, o risco de as declarações de rendimentos não permitirem efetuar a demonstração dos factos em que assenta o pedido de indem- nização por danos patrimoniais reportados ao rendimento mensal do lesado auferido à data do acidente. Pelo exposto, é facilmente verificável a concretização de todos os mencionados interesses prosseguidos mediante a medida legislativa ora em apreciação. Aliás, o rendimento declarado para efeitos fiscais só não corresponderá ao seu rendimento real, caso o interessado tenha intencionalmente omitido algum valor. Nessa perspetiva, a limitação probatória em causa surge como uma espécie de exceptio doli ( praeteriti ) nor- mativa: a posição adquirida por via de uma atuação de má-fé não merece ser tutelada pelo direito. De resto, a vertente da «ética de cumprimento fiscal» deve ser devidamente valorizada e ponderada. Com efeito, impõe-se considerar em tal contexto a autorresponsabilidade do cidadão-contribuinte e suas consequências relativamente ao cumprimento das suas obrigações. Na verdade, o pagamento dos impostos legítimos corresponde a um dever fundamental autónomo imediatamente decorrente da própria ideia de Estado como comunidade política (cfr. os artigos 103.º e 104.º da Constituição; nestes termos, vide Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 5.ª edição, Almedina, Coimbra, 2012, p. 151). Como sustenta Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, Almedina, Coimbra, 1998, pp. 186-187.

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