TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

250 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva» (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, p. 190). Na verdade, a limitação em causa traduz uma restrição do direito à produção de prova ou do «direito constitucio- nal à prova» (J. J. Gomes Canotilho, «O ónus da prova na jurisdição das liberdades: Para uma teoria do direito cons- titucional à prova», in Estudos sobre direitos fundamentais, Coimbra Editora, 2.ª edição, 2008, pp. 169 segs., p. 170), ínsito na garantia de acesso aos tribunais e «entendido como poder de uma parte (pessoa individual ou pessoa jurídica) ‘representar ao juiz a realidade dos factos que lhe é favorável’ e de ‘exibir os meios representativos desta realidade’». Ora, nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, a restrição deste direito fundamental exige que se encontre na própria Constituição (pelo menos noutros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos) base para a limitação do direito em causa, bem como que esta se limite «ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos» (não podendo, por outro lado, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, «diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais»).» O grau de exigência a aplicar em tal avaliação reconduz-se ao enunciado, por exemplo, no Acórdão n.º 530/08: «A questão essencial que se coloca – tal como se expendeu no acórdão n.º 646/06, que também abordou esta temática – é, pois, a de saber se, na emissão de uma norma restritiva do uso dos meios de prova, o legislador respeitou, proporcionada e racionalmente, o direito de acesso à justiça na sua vertente de direito de o interessado produzir a demonstração dos factos que, na sua ótica, suportam o «direito» ou o «interesse» que visa defender pelo recurso aos tribunais. Uma resposta negativa a essa questão apenas pode perspetivar-se, neste contexto, quando se possa concluir que a norma em causa determina, para a generalidade de situações, que o interessado se veja cons- trito à impossibilidade de uma real defesa dos seus direitos ou interesses em conflito.» ii. Com especial pertinência para a compreensão dos interesses justificativos da limitação probatória consa- grada no preceito objeto do presente recurso, pode ler-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 153/2008, de 6 de agosto – o diploma que introduziu o n.º 7 do artigo 64.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, aqui em apreciação: «Uma das medidas previstas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 172/2007, de 6 de novembro, diz res- peito à “revisão do regime jurídico aplicável aos processos de indemnização por acidente de viação, estabelecendo regras para a fixação do valor dos rendimentos auferidos pelos lesados para servir de base à definição do montante da indemnização, de forma que os rendimentos declarados para efeitos fiscais sejam o elemento mais relevante.” Com efeito, hoje sucede que a determinação do valor dos rendimentos auferidos pelos lesados em processos de indemnização por acidente de viação, na medida em que contribuem para a definição do quantum indemnizatório por danos patrimoniais, gera litígios evitáveis, uma vez que as seguradoras, em regra, baseiam o respetivo cálculo nos rendimentos declarados pelos lesados à administração tributária, ao passo que os sinistrados, não raras vezes, invocam em juízo rendimentos superiores, sem qualquer correspondência com as respetivas declarações fiscais. Trata-se, portanto, de uma área que, em razão da potencial litigiosidade que lhe está associada, requer a apro- vação de regras mais objetivas, que baseiem o cálculo da indemnização, quanto aos rendimentos do lesado, na declaração apresentada para efeitos fiscais. Assim, não obstante o avanço trazido pela Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, que veio fixar os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta razoável para indemnização do dano corporal, torna-se imperioso pôr cobro ao potencial de litigiosidade que aquela situação encerra, procurando, por um lado, contribuir para acentuar a tendencial correspondência entre a remuneração inscrita nas declarações fiscais e a remuneração efetivamente auferida –sinalizando-se também aqui, o reforço de uma ética de cumprimento fiscal – e, por outro, aumentar as margens de possibilidades de acordo entre seguradoras

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