TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

24 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 5. As normas sob apreciação incluem-se numa medida de política legislativa criminal consistente em aditar um novo tipo legal de crime, com a designação «enriquecimento injustificado», ao Código Penal (artigo 335.º-A) e a uma lei avulsa – Lei n.º 34/87, de 16 de julho, que aprova o regime dos crimes da responsabilidade dos titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos [doravante, e por razões de bre- vidade, referir-se-á apenas à «responsabilidade» de titulares de cargos políticos, incluindo-se nesta genérica categoria também os titulares de altos cargos públicos] (artigo 27.º-A). Tal medida de política legislativa criminal não é nova. Decorre da estrutura e do conteúdo do Decreto da Assembleia da República n.º 369/XII, bem como dos trabalhos preparatórios, que a mesma se situa em linha de continuidade com uma outra, constante de anterior deliberação parlamentar (Decreto da Assem- bleia da República n.º 37/XII, DAR II Série-A, n.º 128/XII/1, 27 de fevereiro de 2012, pp. 2-8). As normas contidas neste Decreto foram objeto de fiscalização preventiva da constitucionalidade. Tendo, nessa ocasião, através do Acórdão n.º 179/12, emitido o Tribunal uma pronúncia de inconstitucionalidade, foi o referido Decreto devolvido ao parlamento, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 279.º da Constitui- ção ( DAR II Série-A, n.º 165/XII/1, 18 de abril de 2012, p. 3). Retira-se ainda da leitura da «Exposição de Motivos» que acompanhou o Projeto de Lei n.º 798/XII (4.ª) ( DAR II Série-A, n.º 87/XII/4, 28 de fevereiro de 2015, pp. 14-22, pp. 14-16), que esteve na origem do Decreto da Assembleia da República n.º 369/XII, que, tendo o legislador mantido medida de política legislativa criminal análoga, na sua inspiração, à que já tinha sido objeto do Decreto n.º 37/XII, foram agora introduzidas modificações cujo principal desiderato terá sido o de ultrapassar a anterior pronúncia de inconstitucionalidade. Basta atentar no seguinte excerto da «Exposição de Motivos»: «Considerando, ainda, que o Tribunal Constitucional na douta jurisprudência do Acórdão 179/2012, funda- mentou a pronúncia por inconstitucionalidade do decreto da Assembleia da República n.º 37/XII, com base nas seguintes conclusões fundamentais: 1. A impossibilidade de discernir na base da incriminação um bem jurídico claramente definido (com digni- dade penal); 2. A impossibilidade de discernir a conduta concretamente proibida; 3. A violação da presunção da inocência do arguido decorrente da estrutura típica das normas aprovadas pelo parlamento conduzir à presunção da origem ilícita da incompatibilidade entre o património e o rendimento; 4. Tratar-se de crime subsidiário. Cumpre-nos dar resposta às questões de inconstitucionalidade apreciadas na jurisprudência citada, razão pela qual promovemos uma mais detalhada identificação dos bens jurídicos tutelados, bem como caracterizamos com maior precisão o comportamento censurado e garantimos que a prova dos elementos do crime compete exclusiva- mente ao Ministério Público. Por outro lado, e como é constitucionalmente exigido, tratando-se da aplicação de uma pena criminal, os acu- sados pela prática do crime que se prevê gozarão de todas as garantias de processo criminal, perante os tribunais». 6. Assim, e sem pretender sobrevalorizar o elemento histórico na interpretação da lei, poderá ter uti- lidade, para efeitos da apreciação da conformidade constitucional das normas impugnadas, confrontar, na parte relevante, o teor do Decreto n.º 369/XII com o teor do Decreto n.º 37/XII. Muito sucintamente, verifica-se existirem, essencialmente, cinco diferenças. Em primeiro lugar, enquanto através do Decreto n.º 37/XII o legislador pretendia introduzir na ordem jurídico-penal três tipos legais de crime, no Decreto n.º 369/XII apenas se prevê a introdução de dois tipos legais de crime, tendo o legislador abandonado a incriminação autónoma do crime em questão quando pra- ticado por funcionário (cfr. artigo 1.º, n. os 2 e 3, do Decreto n.º 37/XII). Em segundo lugar, enquanto no Decreto n.º 37/XII se previa a incriminação do «enriquecimento ilí- cito», sendo, esta, aliás, a designação correspondente à epígrafe dos preceitos legais introduzidos, no Decreto n.º 369/XII prevê-se o crime de «enriquecimento injustificado».

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