TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
233 acórdão n.º 266/15 ii) O “direito ao recurso” como decorrência do direito de acesso aos tribunais e o direito a um processo equitativo 17. Constitui jurisprudência contante do Tribunal Constitucional, que o direito de acesso aos tribunais não impõe sempre o acesso dos interessados a diferentes graus de jurisdição para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. De facto, «a existência de limitações à recorribilidade funciona como meca- nismo de racionalização do sistema judiciário, permitindo que o acesso à justiça não seja, na prática, posto em causa pelo colapso do sistema judiciário, decorrente da chegada de todas ou de uma larga maioria das ações aos diversos “patamares” de recurso» (cfr. Acórdão n.º 561/14, n.º 1 da Fundamentação). Todavia, na definição do regime de recursos não deixa o legislador ordinário de estar limitado pelas diretrizes do direito a um processo equitativo, consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, no qual se refletirão os princípios estruturantes de um Estado de direito democrático, como sejam os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da proteção da confiança. O processo equitativo impõe que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efetivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, nomeadamente prazos razoáveis de recurso nos casos em que esse direito esteja previsto, sem comprometer a descoberta da verdade material e a decisão ponderada da causa num prazo razoável. Para além destas limitações, o legislador dispõe de reconhecida margem de liberdade na conformação no estabelecimento das regras sobre recursos em cada ramo processual, designadamente em processo civil e laboral. Ponto é que essas regras não traduzam a imposição de ónus de tal forma injustificados ou despropor- cionados que acabem por importar lesão da garantia de acesso à justiça e aos tribunais (cfr., por exemplo, o Acórdão n.º 266/93, n.º 9). 18. A questão que o presente recurso coloca consiste, portanto, em saber se a efetividade do direito ao recurso se encontra devidamente assegurada pela estipulação de um prazo de 10 dias para interpor recurso de apelação de despacho saneador que, conhecendo do mérito da causa, designadamente de pedidos formulados pelo autor, não coloca termo aos autos. Para um correto enquadramento da questão, importa relembrar que a norma impugnada foi aplicada no âmbito de uma ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, que, como já foi referido, reveste forma especial (artigos 98.º-B e seguintes do CPT) e, tendo embora natureza urgente [artigo 26.º, n.º 1, alínea a) , do CPT], admite sempre recurso para a Relação (artigo 79.º-A do CPT), ação criada pelo legislador com o propósito claro de agilizar a apreciação judicial do despedimento. Manifesto é, em primeiro lugar, que a norma em apreço não inibe o direito a uma tutela jurisdicional, nem exclui o direito ao recurso. Ela limita-se a determinar uma diminuição do prazo para a interposição de recurso de decisões que conhecem parcialmente de mérito sem que seja posto termo ao processo. Todavia, a verdadeira relevância deste prazo de dez dias não pode ser alcançada pela sua consideração isolada à margem da compreensão da tramitação processual prevista para a forma de processo em que se insere. Ora, em coerência com os objetivos de simplicidade e celeridade anunciados pelo legislador para a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, a ação inicia-se com a simples entrega, pelo trabalhador, no tribunal competente, de requerimento em formulário eletrónico ou em suporte de papel, do qual conste a sua declaração de oposição do despedimento (artigo 98.º-C). Recebido o requerimento, o juiz designa data para a audiência das partes, a realizar no prazo de 15 dias (artigo 98.º-F), no âmbito da qual terá lugar uma tentativa de conciliação. Frustrada esta tentativa, é imediatamente notificado o empregador para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos das formalidades exigidas, apresentar rol de testemunhas e requerer quaisquer provas (artigo 98.º-I). O empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de des- pedimento comunicada ao trabalhador. O trabalhador pode contestar, para o que tem também o prazo de 15 dias (artigo 98.º-L). Com os articulados são logo juntas e/ou requeridas as provas. Segue-se o saneamento do
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