TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
213 acórdão n.º 262/15 II – Fundamentação 6. O artigo 204.º da Constituição, sob a epígrafe “Apreciação da inconstitucionalidade” estabelece que “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados”. Assim, nos termos do disposto no referido artigo, impende sobre o Tribunal Constitucional o dever de recusar a aplicação de normas que infrinjam a Lei Fundamental. Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira ( Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, p. 797), “a obrigação de não aplicar normas inconstitucionais vale para todos os tribunais, incluindo os tribunais arbitrais, sem excluir naturalmente o próprio TC, como tribunal que é, quer quando ele funciona como tribunal de instância, julgando os assuntos que a Constituição e a lei lhe atribuem para além da fiscalização da inconstitucionalidade (cfr. artigo 225.º, n.º 1), quer nos processos de inconstitucionalidade, quanto às respetivas normas processuais” (No mesmo sentido, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo VI, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 246). 7. Dispõe o n.º 4 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que “[o]s recursos previs- tos nos números anteriores são apresentados, por meio de requerimento acompanhado de cópia do processo arbitral, no tribunal competente para conhecer do recurso”. Tal norma remissiva abrange o recurso previsto no n.º 1 da mesma disposição, ou seja, o recurso para o Tribunal Constitucional. 8. Porém, em sentido divergente, o artigo 76.º, n.º 1, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional) estatui que “compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respetivo recurso”. 9. Conclui-se, portanto, que a norma, extraível da conjugação dos n. os 1 e 4 do artigo 25.º do Decreto- -Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, no segmento em que determina que o recurso para o Tribunal Consti- tucional, incidente sobre a decisão arbitral prevista no n.º 1, é apresentado por meio de requerimento, no tribunal competente para conhecer do recurso, ou seja, no próprio Tribunal Constitucional, contraria o disposto no artigo 76.º, n.º 1, da LTC. 10. Ora a LTC disciplina a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional – maté- ria de reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea c) do artigo 164.º – correspondendo a lei orgânica – cfr. artigos 166.º, n.º 2, e 168.º, n.º 5 – dotada, por isso, de valor reforçado – ex vi artigo 112.º, n.º 3, todos da CRP. Tal diploma legal disciplina, de forma uniforme e exclusiva – sem prejuízo da aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, nos termos do artigo 69.º – a tramitação do recurso de constitucionalidade, apenas podendo ser alterada por lei orgânica. O ato de apreciação da admissibilidade do recurso de constitucionalidade é um ato inserido na trami- tação do próprio recurso de constitucionalidade, constituindo matéria de reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea c) do artigo 164.º da CRP. E entende-se que esta reserva consubstancia uma “reserva in totum ”, no sentido de que abrange a totalidade da matéria indicada, com exclusão da possibilidade de intervenção normativa de outra entidade que não a Assembleia da Repú- blica (nesse sentido, Miranda, Jorge; Medeiros, Rui, Constituição Portuguesa Anotada, tomo II, Coimbra, Coimbra Editora, 2006, anotação ao artigo 164.º, pp. 516-517).
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