TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
206 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL não chegou a um juízo de invalidade; aplicou o último – e mais exigente – teste da «proporcionalidade em sentido estrito», e foi com base nele, e só nele, que julgou inconstitucional a medida. E isto, por duas razões fundamentais. Primeira, por atingir, a opção legislativa – diz o Acórdão – «cidadãos em situação de grave vulnerabilidade, sem meios imediatos para satisfazer necessidades vitais do agregado familiar, que foram, como ficou demonstrado, admitidos em Portugal no cumprimento das regras fixadas pelo legislador, nomea- damente quanto à fixação de requisitos relativos à disponibilidade dos meios de rendimento». Segunda – diz ainda o Acórdão – por ter o Tribunal ponderado «associadamente, a pouca relevância da despesa do RSI no orçamento global da Segurança Social e o peso diminuto dos gastos com a concessão de RSI a não nacio- nais». Por assim ser, concluiu-se à evidência pela desproporção [entre a afetação dos direitos e a finalidade de interesse público prosseguida] «já que o valor desta prestação [do RSI] é reduzida e abrange um número muito limitado de destinatários». 5. Não me parece, contudo, que alguma vez se pudesse incluir no âmbito de competências próprias do Tribunal a possibilidade de levar a cabo o mais exigente dos «testes» da proporcionalidade com a apresentação destas duas razões. Como se disse no Acórdão n.º 187/01, com este último «teste» a jurisdição constitucional (a portuguesa como qualquer outra) trata de «exigir que a intervenção, nos seus efeitos restritivos ou lesivos, se encontre numa relação “calibrada” – de justa medida – com os fins prosseguidos, o que exige uma ponde- ração, graduação e correspondência dos efeitos e das medidas possíveis». Como saber, aqui, que a exigência de residência de três anos em Portugal para estrangeiros que pretendessem aceder ao RSI se não encontrava em relação de justa medida com a finalidade de garantir a sustentabilidade do sistema de segurança social, evitando a existência de candidatos a prestações de solidariedade que nenhum elo de ligação tivessem com a comunidade nacional? Não creio que o argumento apresentado em primeiro lugar, e atinente ao cumpri- mento das regras já fixadas pelo legislador relativamente aos requisitos de admissibilidade de estrangeiros no território nacional – e que, de facto, incluem, entre outras, exigências relativas à demonstração de rendimen- tos – pudesse valer, neste contexto, como argumento legítimo. Tratando-se de regras que se inscrevem na definição de políticas de imigração (critérios para o acolhimento de estrangeiros em Portugal) a finalidade constitucional por elas prosseguida é diversa da finalidade prosseguidas pelas medidas em juízo, dirigidas a assegurar a sustentabilidade do sistema de segurança social. E ainda que se concluísse pela inevitável conti- guidade das duas políticas (e pelos reflexos inevitáveis que a política de imigração pudesse vir a ter no rumo a tomar pelas políticas públicas de sustentabilidade da segurança social), então, por que não concluir de forma precisamente inversa àquela que foi acolhida pelo Tribunal? Por que não considerar que o «pequeno número» de estrangeiros que se encontram na situação de requerer prestações de RSI se deve, precisamente, aos efeitos que a política de imigração tem sobre a política de sustentabilidade da segurança social? A meu ver, a dúvida só demonstra que, neste contexto – e para efetuar o «teste» da proporcionalidade em sentido estrito – o Tribunal se deveria ter atido a uma estrita ponderação entre os efeitos restritivos da medida legislativa em juízo e os fins por ela (e só por ela) prosseguidos. Efetuar a ponderação tendo em conta fins prosseguidos por outras medidas extravasa muito, a meu ver, do juízo que é permitido ao Tribunal no contexto metódico deste «teste». Por isso mesmo, aliás, serão sempre controvertíveis os resultados a que, por essa via, se chegará. Para além disso, porém, como poder avaliar, com a segurança com que se avaliou, que era “diminuto” o “peso dos gastos com a concessão de RSI”? 6. Como quer que seja, haverá sempre que concluir que o Tribunal aplicou, a esta «afetação» legislativa do direito a aceder à prestações de RSI, um escrutínio de intensidade máxima. Contudo, não esclareceu qual a razão constitucional que legitimava a extensão da sua intervenção. Na verdade, se se partir do princípio segundo o qual o controlo de proporcionalidade de medidas legis- lativas que o Tribunal está constitucionalmente habilitado a fazer é sempre e só de teor negativo; se se partir do princípio segundo o qual a demonstração, por parte de quem julga, da justeza desse controlo negativo será tanto mais exigente quanto maior for a liberdade de conformação legislativa sobre certa matéria, então,
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=