TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

20 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 15.º Esta enunciação é, de resto, singular no contexto do Código Penal Português. A generalidade dos tipos penais definidos dispensa a enunciação dos bens jurídicos protegidos. 16.º A própria necessidade sentida pelo legislador de explicitar uma enunciação destes valores já deixa antever a incerteza que envolve o recorte do tipo aqui em causa. 17.º Pois não bastará ao legislador elencar tais valores ou princípios se o tipo penal os não proteger autónoma e especificadamente. 18.º Assim, a forma encontrada para superar a dificuldade assinalada na definição dos bens jurídicos protegidos pela incriminação em causa é suscetível de violar o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição. 19.º Do mesmo modo parecem permanecer dúvidas quanto à determinação das condutas concretamente proibidas. 20.º Com efeito, como resulta de elementos constantes dos trabalhos preparatórios, não é claro que esta incrimi- nação incida sobre condutas, parecendo antes incidir sobre situações de facto. Ora, o direito penal deve incidir sobre e punir condutas ou omissões e nunca estados ou situações de facto uma vez que inexiste um Direito Penal do facto, assim parecendo violar o princípio da legalidade penal, na sua vertente tipicidade, previsto no artigo 29.º da Constituição. 21.º Com efeito, não parece que o Decreto logre ultrapassar as dificuldades inerentes à determinabilidade da ação ou omissão concretamente proibidas. 22.º O Decreto mantém a incriminação da aquisição, posse ou detenção de património incompatível com os ren- dimentos. 23.º Ora, como resultava inequívoco do Acórdão do Tribunal Constitucional relativo ao Decreto que aprovava o regime do enriquecimento ilícito, a punição da mera aquisição, posse ou detenção não parece compatível com a determinabilidade que deve subjazer a uma norma penal, sobretudo à luz dos princípios constitucionais da tipici- dade e da presunção de inocência. 24.º Deste modo, o regime agora aprovado também parece violar o princípio constitucional da presunção de ino- cência, consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição e inerente ao princípio do Estado de direito, previsto no artigo 2.º 25.º Com efeito, mesmo na nova formulação, não se vê como poderá o arguido libertar-se da acusação que sobre ele impende.

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