TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

192 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL De acordo com esta jurisprudência, o RSI é uma prestação que efetiva a garantia de existência condigna, sendo esta uma imposição direta do respeito pela dignidade humana. Este enquadramento e esta matriz con- ferem ao direito em causa um estatuto próprio, um significado autónomo sendo-lhe reconhecido um grau de fundamentalidade (e, logo, de vinculação constitucional e redução de margem de liberdade do legislador). Não falta, até, quem vá mais longe, considerando que o direito à vida significa também “o direito a viver com dignidade”, o direito “a dispor das condições de subsistência”, com o correlativo “dever do Estado con- tribuir para a realização das prestações existenciais indispensáveis a uma vida minimamente digna” (Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit. , p. 451). Desta conceção andou próximo o Acórdão n.º 306/05, ao expri- mir a ideia de que a insatisfação do direito a alimentos dos menores “comporta o risco de pôr em causa, sem que o titular possa autonomamente procurar remédio, se não o próprio direito à vida, pelo menos o direito a uma vida digna”. O que parece certo é que, mesmo situando-o fora do âmbito normativo do direito à vida, este direito a uma prestação que salvaguarde um mínimo de existência condigna pode ser qualificado, na linha do Acór- dão n.º 509/02, como um direito autónomo, construído a partir da conjugação do princípio do respeito da dignidade humana com o direito à segurança social. 25. Como foi dito, este Tribunal caracterizou o Rendimento Social de Inserção, no referido Acórdão n.º 509/02 (então, Rendimento Mínimo Garantido), como um direito a uma prestação de segurança social que garante o direito constitucional a um mínimo vital, de existência condigna, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana. Nestes termos, deverá verificar-se um motivo forte para se impor uma exceção ao princípio da equiparação nesta vertente, devendo a restrição imposta aos estrangeiros relativamente ao RSI limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. O Governo sustenta que o requisito em causa não é arbitrário nem viola o princípio da proporciona- lidade, já que se destina a assegurar o interesse constitucionalmente tutelado da sustentabilidade financeira do regime de segurança social, visando preservar o RSI do “efeito de chamada” dos movimentos migratórios fortemente potenciado pelas relações familiares dos imigrantes e que pode mesmo perverter o sentido de prestações sociais como o Rendimento Social de Inserção. O Tribunal Constitucional terá de decidir se a plausibilidade e importância desta razão invocada pelo legislador são ou não suficientes para justificar o desvio ao princípio da igualdade de tratamento entre nacio- nais e estrangeiros. É evidente que a preservação da sustentabilidade do sistema de segurança social se afigura como funda- mento bastante para justificar exceções ao princípio da equiparação, já que se trata de um elemento funda- mental de garantia de vários direitos fundamentais. Note-se, todavia, que os dados estatísticos disponíveis, acima apresentados, não confirmam a ideia avançada pelo Governo de risco de afluxo anormal de imigrantes, com o objetivo de aceder à prestação. Veja-se que o número total de beneficiários e a despesa com a presta- ção têm vindo a diminuir desde 2010 e que os números respeitantes a estrangeiros mostram que os mesmos constituem uma percentagem muito diminuta do total de beneficiários. Por outro lado, os mesmos dados mostram a importância que a imigração tem tido para contrabalançar o envelhecimento demográfico do sistema de segurança social, contribuindo para a sua sustentabilidade, aliviando-o. 26. Ainda que se considere procedente a justificação do Governo para consagrar um regime menos favorável de atribuição do Rendimento Social de Inserção a cidadãos estrangeiros, entendendo-se assim estar adequadamente fundamentada a exceção ao princípio de equiparação, deverá, porém, confrontar-se o específico regime jurídico ora questionado com as exigências constitucionais decorrentes do princípio da proporcionalidade. Como se afirmou no Acórdão n.º 345/02, «o princípio da proporcionalidade que aqui se surpreende exige – como se retira do longo acervo da jurisprudência constitucional nesta matéria – que as medidas restritivas legalmente previstas sejam o meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei, ou seja, para a salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos, sendo necessários

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