TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

17 acórdão n.º 377/15 a formulação da incriminação dar a conhecer o que é ou não proibido pelo direito, comprometida estará também a possibilidade de se anteverem os bens que justificariam a incriminação, tanto bastan- do para que se considere que no caso se não cumpriu a exigência que decorre do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, segundo a qual só será constitucionalmente legítima a medida de política criminal que, traduzindo-se na instituição de uma nova incriminação, vise a preservação de um «valor social» cuja tutela se mostre dotada de dignidade jurídico-penal. XII – A estas considerações não obstam as indicações que o próprio Parlamento forneceu, no n.º 2 do artigo 335.º-A, relativamente às razões pelas quais assim decidia instituir o crime de enriquecimento injusti- ficado, pois o bem jurídico digno de tutela penal (maximamente digno dessa tutela) que, segundo as palavras do legislador, justificaria a incriminação constante do n.º 1 do artigo 335.º-A que o Decreto da Assembleia pretenderia aditar ao Código Penal não é, face à formulação literal que esse mesmo Decreto confere à norma penal incriminadora, passível de ser divisado enquanto finalidade a ser pros- seguida pela incriminação. XIII – Quanto à segunda medida de política criminal que nos presentes autos é impugnada – constante do artigo 2.º do Decreto n.º 369/XII e que diz respeito aos crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos – o crime de enriquecimento injustificado, a ser aditado à lei sobre os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos através da sua inscrição como artigo 27.º-A, no qual se formula uma incriminação típica que é em tudo homóloga àquela que consta do artigo 335.º-A a aditar ao Código Penal, só se distingue do outro crime com o mesmo nome, pre- visto para ser aplicado a qualquer cidadão, pela especial condição do agente que o comete e pela maior severidade das sanções que lhe são aplicáveis, permanecendo em tudo o resto idêntica a estrutura dos dois tipos incriminadores. XIV– Sendo assim construído o tipo constante do artigo 27.º-A, todas as questões que se colocaram a propósito do seu homólogo (o previsto no artigo 335.º-A, a aditar ao Código Penal) mantêm inteira pertinência: desde logo, o enriquecimento injustificado dos titulares de cargos políticos permanece, tal como o crime homólogo perpetrado pelo «cidadão comum», um crime de situação ou de estado de coisas; além disso, logo na formulação do tipo criminal e pelo modo como ele foi construído, con- trariou-se o princípio da presunção de inocência, entendido, na sua dimensão substantiva, enquanto vínculo do próprio legislador penal; finalmente, a indeterminação, que permanece na construção típica do crime de enriquecimento injustificado dos titulares de cargos políticos, não permite que se conclua que, através dele, se prossegue um bem jurídico digno de tutela penal, pelo que também por este motivo lesa a norma referida o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição. Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. O Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 278.º da Constituição da Repú- blica Portuguesa (CRP) e dos artigos 51.º, n.º 1, e 57.º, n.º 1, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade com a

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