TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

152 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL da proteção da confiança, decorrente do artigo 2.º da Constituição, e do direito de contratação coletiva. Algumas dessas considerações são genericamente válidas no caso em apreço. A existência de um direito à contratação coletiva com um mínimo de conteúdo útil exige que o legislador respeite as expectativas fundadas na continuidade da vinculação resultante dos instrumentos de regulamentação coletiva, pelo período convencionado, por um lado, e que, naturalmente, aqueles que os adotam possam com eles contar para a conformação da sua vida, por outro. O respeito pela contratação coletiva em si mesmo considerada (e constitucionalmente prevista) obriga a que se respeitem as expectativas, dignas de tutela, que os instrumentos de regulamentação coletiva geraram. A meu ver, independentemente da natureza das matérias em causa, ou seja, independentemente de o objeto da contratação coletiva integrar a reserva de convenção coletiva, a confiança que a contratação coletiva em si mesma pressupõe, e que é base da sua essência, condição fundamental da sua existência, sempre imporia o respeito pelos conteúdos antes negociados, até ao final dos períodos contratualmente estipulados. A confiança é, afinal, crucial ao exercício pleno da liberdade de contratação coletiva, dotando-a de sentido. Ou seja, o legislador não pode atingir de forma tão significativa os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho já celebrados e em vigor, sem com isso ferir de modo excessivo a confiança dos contraentes na longevidade antecipadamente fixada do instrumento de regulamentação coletiva, ferindo a garantia da própria contratação coletiva. A quebra do acordo celebrado, por imposição legal, com as suas consequências lesivas, constitui uma ablação significativa da confiança nos instrumentos de regulação coletiva, frustrando a certeza que as partes haviam depositado na manutenção do acordado». Já relativamente ao caráter imperativo dos regimes que fixam o valor de retribuição do trabalho suple- mentar e noturno, do subsídio de refeição, abono de ajudas de custo e transporte, vedando, para o futuro, a reconfiguração, mediante exercício do direito à contratação coletiva, do regime agora estabelecido de forma excecional (que é o regime aplicável aos trabalhadores com vínculo de trabalho em funções públicas), consi- dero que as normas em apreciação afetam de modo grave este direito. Comece-se por esclarecer que me afastei da interpretação das normas a que procedeu o Acórdão, con- cordando com o requerente: entendo que o disposto no n.º 4 do artigo 18.º veda o recurso à contratação coletiva a trabalhadores sujeitos, em regra, à disciplina geral do contrato de trabalho e ao direito privado, ficando agora obrigados pelas regras substantivas em matéria de valor de retribuição do trabalho suplementar e noturno, do subsídio de refeição, abono de ajudas de custo e transporte estabelecidas para os trabalhadores em funções públicas. Com tais normas, o legislador consagrou uma disciplina menos flexível do que a que vale para os próprios trabalhadores com vínculo de trabalho em funções públicas. Assim, a posição de divergência relativamente à posição da maioria advém, em especial, da interpretação que faço das normas questionadas, não coincidente com a que resulta do acórdão. Na verdade, não aceito que as normas do artigo 18.º transponham para o âmbito das entidades públicas empresariais todo o regime jurídico previsto para os trabalhadores em funções públicas em matéria de subsídio de refeição, ajudas de custo e de transporte, remuneração do trabalho suplementar e do trabalho noturno, nessa transposição se incluindo, na visão da maioria, as regras que preveem que este regime pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva. Se o aceitasse, tal significaria – onde esses regimes admitissem a regulamentação coletiva – que o exercício desse direito não seria completamente afastado, apenas teria de ser exercido dentro das limitações impostas aos trabalhadores contratados em funções públicas. Não é, todavia, este, o sentido que atribuo ao disposto no artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 133/2013. Note-se que o artigo 17.º deste diploma começa por estabelecer o regime laboral geral – o regime jurí- dico do contrato individual de trabalho –, fixando, também, a regra em matéria de contratação coletiva – a estabelecida na lei geral. O artigo 18.º (n. os 1, 2 e 3) vem criar exceções ao regime geral, relativamente ao subsídio de refeição, às ajudas de custo, ao trabalho suplementar e ao trabalho noturno, determinando que nestes casos se aplicará a disciplina prevista para os trabalhadores em funções públicas. A meu ver, quando o

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