TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015

136 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL coletiva através da edição de normas imperativas, o legislador ordinário não pode deixar de lhe garantir, no espaço de regulação da matéria atinente aos direitos dos trabalhadores consagrados nos artigos 58.º e 59.º da Constituição, um mínimo de “eficácia constitucionalmente relevante” (cfr. J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. loc. cit. ). De um ponto de vista operativo, tal implica que as restrições a introduzir no direito à autonomia contratual coletiva não possam, por um lado, atingir o “conteúdo essencial” desse direito, assim materialmente delimitável, e devam, por outro, apresentar-se “necessárias para a salvaguarda de outros direitos e interesses” (cfr. Acórdão n.º 517/98), permitindo que à imperatividade do regime legal de que em concreto se trate possam ser associadas ponderosas “razões de ordem pública” (cfr. Acórdão n.º 94/92). No âmbito das relações estabelecidas entre sujeitos tradicionais de direito privado – isto é, entre entes cuja natureza privada é originária e intrínseca, não se encontrando por isso sujeitos à incidência de vincula- ções jurídico-públicas –, o Tribunal debateu já a temática da “convivência” de normas legais imperativas com a competência coletiva de conformação autónoma». No Acórdão n.º 94/92, que concluiu pela não incons- titucionalidade da subtração ao domínio da contratação coletiva da matéria do procedimento disciplinar, assim como no Acórdão n.º 391/04, que se pronunciou no mesmo sentido relativamente à decisão de não deixar na disponibilidade das partes a conformação da matéria respeitante à cessação do contrato de trabalho, escreveu-se, a tal propósito, o seguinte: «Não está em causa a admissibilidade, em Direito do Trabalho, de normas legais imperativas, maxime de nor- mas imperativas de condições fixas, ou seja “aquelas que exprimem uma ingerência absoluta e inelutável da lei na conformação da relação jurídica de trabalho, por forma tal que nem os sujeitos do contrato podem substituirlhes a sua vontade, nem os instrumentos regulamentares hierarquicamente inferiores aos que as contêm podem fazer prevalecer preceitos opostos ou conflituantes com elas” (Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 6.ª edição, Coimbra, 1987, p. 233). (…) É por isso que a abertura à contratação a que se refere o artigo 56.º da Constituição se apresenta, pela própria letra do preceito, como uma abertura legislativamente conformada. Além disso, no âmbito do Direito do Trabalho, a proteção do trabalhador não é o único interesse digno de ser tutelado. A inderrogabilidade de certos regimes legais surge também associada a razões de ordem pública que ultrapassam os interesses particulares do trabalhador. Como refere Bernardo Xavier: “o direito do trabalho está agora mais aberto aos interesses gerais, à economia, e particularmente ao emprego. Ele não presta atenção apenas à justiça e equilíbrio das possíveis relações entre os sujeitos individuais do contrato de trabalho, nem se preocupa tãosomente com o sistema conflitual dos protago- nistas dos interesses de classe” (“A crise e alguns institutos de direito do trabalho”, Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXVIII, n.º 4, 1986, p. 561). E Barros Moura: “Os princípios fundamentais que formam a ordem pública podem adquirir expressão positiva: na Constituição e nas normas legais imperativas. A inderrogabilidade destas últimas só pode derivar do facto de constituírem uma concretização ou explicitação da ordem pública. Contra essa «barreira intransponível» erguida pelo Estado não podem prevalecer os interesses individuais ou os interesses particularizados de certas classes através da autoregulamentação privada, individual ou coletiva” (obra citada, pp. 170 e 171).» 20. O n.º 4 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 133/2013 fixa ao regime estabelecido nos respetivos n. os  1, 2 e 3, como se viu, um caráter não só imperativo como prevalecente, daqui resultando que tal regime não apenas é inderrogável pelo exercício da autonomia coletiva, como se sobreporá, derrogando-os, aos regimes constantes de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho anteriormente celebrados e ainda vigentes. Na medida em que são distintas, as características da prevalência e da imperatividade justificam uma confrontação diferenciada com o direito de contratação coletiva tutelado pelo artigo 56.º, n.º 3, da Consti- tuição.

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