TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
110 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL o [que] for para além da realização desse mínimo de agressividade deverá ser considerado inconstitucional, por consubstanciar uma afetação desnecessária dos direitos protegidos dos particulares. 10. Assim, o interesse público que ordena a norma tem de superar em importância as expectativas dos particu- lares, devendo em caso de dúvida prevalecer a posição do legislador, que terá uma ampla margem de conformação, ainda que essa margem seja reduzida no caso de estarem em jogo direito fundamentais. Será ainda necessário que a restrição passe no teste imposto da proporcionalidade, através do qual, com a ponderação de alternativas, se concluirá pela sua adequação, indispensabilidade e proporcionalidade. 11. Repescamos a fórmula que resulta da construção jurisprudencial relativa à mecânica aplicativa deste prin- cípio, densificada desde o Acórdão n.º 287/90 e expresso no Acórdão n.º 128/09: “De acordo com esta jurisprudência sobre o princípio da segurança jurídica na vertente material da con- fiança, para que esta última seja tutelada é necessário que se reúnam dois pressupostos essenciais: a) a afetação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda b) quando for ditada pela necessidade de salvaguarda de direitos ou interesses constitucionalmente prote- gidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição). Os dois critérios enunciados (e que são igualmente expressos noutra jurisprudência do Tribunal) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou “testes”. Para que haja lugar à tutela jurídico-constitu- cional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda neces- sário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a expectativa. Este princípio postula, pois, uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabili- dade da ordem jurídica e na constância da atuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer, se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados, a Constituição não lhe atribui proteção”. 12. Esta ponderação entre os direitos e interesses em oposição deverá ser feita pelo método com que se julga sobre a proporcionalidade ou adequação substancial de uma medida restritiva de direitos, sendo que mesmo que se conclua pela elevada importância do interesse público na mudança do quadro legislativo, ainda assim, será neces- sário aferir se a medida do sacrifício imposto aos particulares é “inadmissível, arbitrária ou demasiado onerosa” – Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 287/90. 13. Vejamos, então, a aplicação concreta aos preceitos em apreço. 14. Quanto à disposição inscrita no número 2 do artigo 14.º, cumpre dizer que o Estado encetou compor- tamentos capazes de gerar confiança nos particulares neste domínio, pois foi o próprio Estado, na sua atuação no seu setor empresarial, a definir o seu estatuto como trabalhadores e a natureza do seu vínculo. As expetativas destes sujeitos destinatários da norma são legítimas e fundadas em boas razões, não só pelo que acima se expôs, mas também porque, normalmente, as questões salariais tendem a gozar de uma maior estabilidade e segurança. Quanto à realização de planos de vida, é claro que as questões relacionadas com matérias remuneratórias condi- cionam a definição de planos de vida, pois é de acordo com estas que se assumem compromissos e encargos. Por outro lado, também não se vislumbram razões de interesse público que justifiquem esta disposição. Estabelecendo
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