TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
77 acórdão n.º 141/15 à prestação social que é a RSI – desfocando-a do contexto em que é colocada. Visto deste prisma, que é o constante do pedido, o problema não passa pelo exercício do direito fundamental de emigrar e regressar, mas pelo facto de o legislador poder estabelecer como requisito de acesso a uma prestação social a residência em Portugal, dos cidadãos nacionais, durante um determinado período de tempo. De facto, ao adotar esta posição, o Acórdão parece misturar três realidades profundamente distintas: o direito de entrada e de saída do território nacional, o direito de residir em Portugal e o direito fundamental de acesso à Segurança Social. Em termos rigorosos, a distinção que é feita é entre cidadãos nacionais que residem em Portugal há mais de um ano e os que residem há menos. É claro que, no plano dos factos, esta questão pode ser indiretamente relacionada com o exercício do direito de emigrar e/ou de regressar, mas o objeto do pedido não deixa de ser o direito social de acesso a uma prestação social. Não é por não ter acesso imediato ao RSI que um português residente no estrangeiro é inibido do direito de regressar ou de residir em Portugal. Assim, o problema passa pela possibilidade de o legislador limitar o acesso ao RSI com base na neces- sidade de demonstração da existência de um elo efetivo de ligação com a comunidade por parte do cidadão nacional – que a Constituição, repito, não proíbe. Este é o fundamento principal apresentado pelo autor da norma que é afastado pelo Acórdão sem fundamentação que se me afigure ser convincente. Tendo em conta a pouca ponderação que é feita dos argumentos apresentados pelo autor da norma, que não são refutados, não vejo motivos para considerar a medida inconstitucional por violação do princípio da igualdade. 5. Impressionam-me, no entanto, outros aspetos do regime, nomeadamente quanto à duração do período de residência obrigatória (um ano), que pode levantar questões de proporcionalidade. E isto desde logo porque, por exemplo, para efeitos de adquirir a qualidade de contribuinte o legislador se bastou com 184 dias de permanência seguida ou interpolada em território português [artigo 16, n.º 1, alínea a) , do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS)]. Também não são de desprezar as consequências deste regime face ao direito ao mínimo de subsistência, construído nos termos do Acórdão n.º 509/02. Estes aspetos, não explorados pelo Acórdão, poderiam suscitar dúvidas sobre a proporcionali- dade da medida. 6. Independentemente daquelas dúvidas considero que os preceitos em causa são ilegais, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 40.º da Lei de Bases da Segurança Social. De facto, esse preceito após estabelecer que «a atribuição das prestações do subsistema de solidariedade depende de residência em território nacional e demais condições fixadas na lei» (n.º 1), autoriza o legislador a, «no que diz respeito a não nacionais», e apenas nestes casos, «fazer depender o acesso à atribuição de prestações de determinadas condições, nomea- damente de períodos mínimos de residência legal ou de situações legalmente equiparadas». Ora, tratando-se o RSI de uma matéria aqui abrangida e decorrendo a atual redação dos preceitos objeto do presente pedido do Decreto-Lei n.º 133/2012, de 27 de junho, não podem restar dúvidas da vinculação do legislador de desenvolvimento, neste aspeto, à respetiva lei de bases. Se assim é, comprova-se facilmente a falta de habili- tação atribuída pela Lei de Bases ao legislador de desenvolvimento para estabelecer um período mínimo de residência para nacionais. – Maria de Fátima Mata-Mouros. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , I Série, de 16 de março de 2015. 2 – Os Acórdãos n. os 191/88, 412/02 e 232/03 e stão publicados em Acórdãos, 12.º, 54.º e 56.º Vols., respetivamente.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=