TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
61 acórdão n.º 141/15 7. Das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 13/2003, na redação atual, resulta que o período mínimo de residência em território português é o mesmo (um ano) para os cidadãos portugueses e os cida- dãos da União e diverso (três anos) para os imigrantes provenientes de países terceiros. Como vimos, em resposta ao requerimento do Provedor de Justiça, o autor destas normas sustenta que, por força do direito da União Europeia, os cidadãos da União com direito de residência são tratados igual- mente em cada Estado-Membro, independentemente do seu país de origem e que, portanto, ao estabelecer- -se mínimos de permanência em território nacional para a concessão de prestações de natureza continuada, o legislador está a evitar a sua atribuição a qualquer pessoa que entre no território e que passe, por esse único motivo, a ter direito a qualquer apoio destinado aos membros da comunidade. Realmente, se assim for, isto é, se tal imposição decorrer do ordenamento jurídico europeu, o legislador nacional a ela estará obrigado, tanto nos termos do Direito da União (princípio do primado), quanto à luz da ordem constitucional nacional (artigo 8.º, n.º 4, da CRP). Mas, se assim não for, a decisão legislativa, de excluir o acesso de portugueses que tenham «residência legal» em território nacional há menos de um ano ao rendimento social de inserção, corresponderá a uma escolha livre do legislador ordinário, cuja conformidade com a Constituição deverá enquanto tal (isto é, enquanto escolha livre) ser pelo Tribunal apreciada. 8. Não obstante o autor da normas questionadas não indicar qual a norma ou normas de direito da União Europeia que, neste domínio, imporiam aos Estados-Membros uma igualdade de tratamento entre cidadãos nacionais e cidadãos de outros Estados-Membros, deve começar por dizer-se que não decorre sem- pre do Direito da União Europeia a imposição de tratamento uniforme entre nacionais e cidadãos de Esta- dos-Membros da União Europeia. Desde logo, por razões atinentes à natureza da prestação social em causa. Correspondendo o rendimento social de inserção a uma prestação de natureza não contributiva, exclusivamente financiada por transferências do Orçamento do Estado, é certo que se lhe não aplicaria o disposto pelo Regulamento (CE) n.º 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social ( JO, L 166, de 30 de abril de 2004). Com efeito, é isso que ressalta das disposições conjugadas do artigo 4.º e n.º 5 do artigo 3.º desse Regulamento: na primeira, determina-se que «(s)alvo disposição em contrário (…) as pessoas a quem o presente regulamento se aplica beneficiam dos direitos e ficam sujeitas às obrigações da legislação de qualquer Estado-Membro nas mesmas condições que os nacionais desse Estado-Membro»; mas de acordo com a segunda, fora do âmbito de aplicação desta exigência de tratamento igual – porque fora do âmbito de aplicação do próprio regulamento – estarão todas as prestações de «assistência social», na categoria das quais se inclui, pelo seu caráter não contributivo, o rendimento social de inserção. Depois, porque o princípio fundamental da igualdade de tratamento entre nacionais e cidadãos de outro Estado-Membro, diretamente instituído pelo artigo 18.º do TFUE, comporta limitações e derrogações introduzidas pelo próprio direito da UE, no que respeita ao exercício, por parte dos cidadãos da União, da liberdade de circulação e residência, reconhecendo-se por isso o seu caráter “relativo”. É o que resulta das normas da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e de residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros (JO, L 158, de 30 de abril de 2004, p. 77). Após se consa- grar, no “considerando 10” da Diretiva, o princípio da não sobrecarga desrazoável para o regime de segurança social do Estado-Membro de acolhimento, um “valor” claramente oposto ao da liberdade de circulação e residência, a alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º dispõe que uma das condições para que se possa residir no ter- ritório de outro Estado-Membro seja a de dispor «de recursos suficientes para si próprio e para os membros da sua família, a fim de não se tornar uma sobrecarga para o regime de segurança social do Estado-Membro de acolhimento durante o período de residência». Por outro lado, após se prescrever especificamente, no n.º 1 do artigo 24.º dessa Diretiva, a igualdade de tratamento entre cidadãos da União que residam no território do Estado-Membro de acolhimento e nacio- nais desse Estado – o que constitui uma concretização do princípio previsto no artigo 18.º do TFUE (nesse
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