TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

564 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL h) O Estado (seja na veste de legislador, na de administrador ou na de poder jurisdicional) não pode invocar factos que só a ele se devem para fundamentar uma decisão que, causando danos a terceiros, não protege nenhum valor ou bem jurídico de dignidade idêntica ao que sacrifica. i) O direito de um partido político participar em eleições é um direito fundamental que está previsto no artigo 51.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e como tal só pode ser restringido nos casos expressamente previstos na própria Constituição (artigo 18.º, n.º 2 da CRP). j) Ao impedir o recorrente de participar num ato eleitoral, a decisão recorrida viola diretamente o artigo 51.º da CRP, pois que o mesmo, ex vi do artigo 18.º, n.º 1, é diretamente aplicável e vincula as entidades públicas e privadas incluindo os tribunais. l) A norma do artigo 21.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 1/2006, de 13 de fevereiro, na redação introduzida pela Lei Orgânica n.º 1 de 2009, de 19 de janeiro, deve ser declarada inconstitucional por violação dos artigos 51.º; n.º 1 e 8.º, n.º 2 e n.º 1 da CRP, já que restringe um direito fundamental do recorrente fora dos casos expressamente previstos na Constituição. m) Mesmo que por hipótese se admitisse como consentida pela CRP a restrição do artigo 21.º da referida Lei Orgânica – o que não acontece –, essa restrição deveria, nos termos do artigo 18.º, n.º 3 da CRP, «limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos». n) A decisão recorrida bem como a norma legal em que se baseia não indicam os direitos ou interesses constitu- cionalmente protegidos e limitam-se a inutilizar completamente o direito do recorrente de concorrer a um ato eleitoral sem se vislumbrar qual a necessidade de o fazer e em nome de quê o fazem, pelo que, também por isso, devem uma e outra ser declaradas inconstitucionais por violação do artigo 18.º, n.º 3 e n.º 1 da CRP. o) Mas mesmo que – ainda por mera hipótese de raciocínio – se aceitasse que haveria um direito ou interesse constitucional a proteger, nunca a restrição constante da norma do artigo 21.º n.º 1 da LO 1/2006 e da decisão que nessa norma se fundamentou poderiam diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial do direito ínsito na norma do artigo 51.º, n.º 1, que é o de «constituir (...) partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político». p) A norma do artigo 21.º, n.º 1 da LO 1/2006 ofende também o preceito constitucional do artigo 48.º, n.º 1 da CRP, já que impede um número indeterminado de cidadãos que se identificam com os princípios do PDR de tomar parte na vida política da Região Autónoma da Madeira e na direção dos respetivos assuntos públicos através dos deputados que o recorrente elegeria. q) Não há na Constituição da República Portuguesa nenhuma norma que autorize ou preveja a restrição cons- tante do artigo 21.º, n.º 1 da LO 1/2006. r) Num estado de direito democrático as leis bem como as decisões que as aplicam devem proteger e incentivar o exercício dos direitos fundamentais e não restringir ou anular o exercício desses direitos como, infelizmente, o fez a decisão recorrida. s) Termos em que deve a decisão recorrida ser revogada, ordenando-se, consequentemente, a admissão da can- didatura do Partido Democrático Republicano (PDR) às eleições para a Assembleia Legislativa da Madeira marcadas para o dia 29 de março próximo.» Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 3. A questão que cumpre apreciar respeita à suposta inconstitucionalidade do n.º 1 do artigo 21.º da Lei Eleitoral da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1 /2006, de 13 de fevereiro, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2009, de 19 de janeiro, como condição de participação do PDR no processo eleitoral.

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