TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
527 acórdão n.º 227/15 O juízo relativo à violação do princípio da igualdade, na sua dimensão mínima de proibição do arbítrio, pela sua própria natureza, tem que assentar em critérios de evidência que não são compatíveis com pondera- ções a fazer pelo Tribunal Constitucional. E, a meu ver, neste caso, o Tribunal, para proceder ao juízo de inconstitucionalidade, fundou-se essen- cialmente num julgamento de ponderação, uma vez que colocou «num dos pratos da balança da justiça o respeito absoluto pela regra de uma sociedade que se rege pelo direito aplicável no local da sua sede» e, no outro, «o princípio da igualdade, especificamente em matéria de créditos fundados no trabalho subordinado prestado em Portugal» concluindo, a final, pela «prevalência do princípio da igualdade» sobre essa outra «regra», relativa «ao direito aplicável». No entanto, a densidade do escrutínio de que o Tribunal dispõe quando está em causa a censura de escolhas legislativas fundada apenas em violação do n.º 1 do artigo 13.º da CRP não me parece compatível – por razões que, creio, resultam bem claras da jurisprudência sedimentada do Tribunal relativamente ao que deva entender-se por proibição do arbítrio legislativo – com o recurso cumulativo a técnicas de ponderação. A ausência de racionalidade de uma qualquer distinção de regimes que seja estabelecida pelo legislador não se pondera. Verifica-se; e deixa de verificar-se a partir do momento em que, a fundar a diferença, se encontra um qualquer motivo que seja intersubjetivamente inteligível. E isto qualquer que seja o “peso” valorativo próprio que o Tribunal (que não sanciona o mérito das escolhas legislativas) reconheça ou deixe de reconhe- cer a esse mesmo motivo. – Maria Lúcia Amaral. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida. O presente Acórdão parte do seguinte pressuposto: a aplicação do regime de responsabilidade solidária de sociedade em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, previsto no artigo 334.º do Código do Trabalho, apenas a sociedades com sede em Portugal (nos termos do n.º 2 do artigo 481.º do Código das Sociedades Comerciais, doravante CSC) importa um tratamento menos favorável dos trabalha- dores de empresas dominadas por (ou em relação de grupo com) sociedades sediadas no estrangeiro que, desta forma, não gozam do mesmo nível de proteção dos créditos laborais dos trabalhadores de empresas dominadas por (ou em relação de grupo com) sociedades sediadas em Portugal. Um tal pressuposto ficou, todavia, por demonstrar. Apesar de o Acórdão indicar que “o que temos de comparar é a situação jurídico-laboral, no plano dos créditos emergentes desta, de dois (a) trabalhadores portugueses, (b) ao serviço de empresas portuguesas, (c) trabalhando ambos em Portugal”, o que acaba, afinal, por fazer é tão-só questionar o regime decorrente da norma de conflitos aplicável, concluindo que “A distinção operada pelo legislador, na medida em que diferenciou sem fundamento material bastante, não pode deixar de ser considerada contrária à CRP”. Acontece que a diferença detetável na análise do caso resulta da incidência de diferentes regimes de garantias dos créditos laborais, consoante a sociedade dominante da entidade patronal tenha sede em Por- tugal ou noutro país. O que está em causa é, portanto, o regime de responsabilidade aplicável a uma pessoa coletiva com sede fora do território nacional – neste caso, uma sociedade comercial estrangeira integrada no mesmo grupo societário a que pertence a sociedade portuguesa que é a entidade patronal. Ora, resulta do artigo 3.º, n.º 1, do CSC e do artigo 33.º, n. os 1 e 2, do Código Civil, a regra de que é aplicável às pessoas coletivas “a lei pessoal do Estado onde se encontre situada a sede principal e efetiva da administração da sociedade”, competindo à lei pessoal especialmente regular a responsabilidade da pessoa coletiva. Estas normas não integram, porém, o pedido, não tendo sido desaplicadas nem objeto do juízo de inconstitucionalidade, pelo que mantêm a sua vocação de aplicabilidade ao caso. Assim sendo, a lei que regula a responsabilidade da empresa em causa é (e continuará a ser) a lei alemã e não a portuguesa.
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