TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

525 acórdão n.º 227/15 Para evitar equívocos, convém deixar claro que: a) Não temos que comparar sociedades, mas trabalhadores; b) Não temos que comparar trabalhadores alemães e trabalhadores portugueses; c) Não temos que comparar trabalhadores na Alemanha e trabalhadores em Portugal; d) Nem temos sequer que comparar trabalhadores ao serviço de empresas alemãs e trabalhadores ao serviço de empresas portuguesas. Na verdade, o que temos de comparar é a situação jurídico-laboral, no plano dos créditos emergentes desta, de dois (a) trabalhadores portugueses, (b) ao serviço de empresas portuguesas, (c) trabalhando ambos em Portugal. O único fator de diferenciação é a circunstância de as empresas para que trabalham integra- rem grupos económicos, tendo um deles a sociedade dominante sediada em Portugal e o outro a sociedade dominante sediada na Alemanha. É este fator de diferenciação que cumpre apreciar. 20. Permitimo-nos, neste ponto, transcrever de novo um pequeno passo das alegações do magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal: «Isto é, sem que invoque um motivo racional atendível, omisso nos trabalhos preparatórios, o legislador ordi- nário estabelece uma discriminação intolerável entre trabalhadores postados em situações substantivamente idên- ticas, desprotegendo, infundadamente, aqueles que, por força de uma circunstância que não controlam e que, eventualmente, podem desconhecer, contratem com um empregador dominado por sociedade sediada fora de Portugal.» No entender do Tribunal, este é o ponto fundamental: a diferenciação assim construída, fundada em situação cuja lógica escapa aos trabalhadores (note-se que a sociedade dominante até pode mudar o local da sua sede – por razões fiscais, por exemplo –, sem que os trabalhadores portugueses, em Portugal, da sociedade dominada portuguesa disso sejam, ou tenham de ser, informados) e que podem mesmo ignorar – em abso- luto ou, pelo menos, quanto às suas implicações – pode ser considerada «razoável, racional e objetivamente fundada»? Entendemos que não. E, note-se que não estamos a considerar a solução legislativa má ou até a pior possível. O que dizemos é que ela implica – e não poderia implicar – uma diferença de tratamento para a qual se não encontram motivos razoáveis e racionais. E se houvesse de colocar num dos pratos da balança da justiça o respeito absoluto pela regra de que uma sociedade se rege pelo direito aplicável no local da sua sede e no outro prato o princípio da igualdade, espe- cificamente em matéria de garantias dos créditos fundados em trabalho subordinado prestado em Portugal, não haveria dúvidas de que este último deveria prevalecer. Até porque este, ao contrário daquele outro, se apoia numa norma constitucional. A distinção operada pelo legislador, na medida em que diferenciou sem fundamento material bastante, não pode deixar de ser considerada contrária à CRP. Nestas condições, impõe-se sufragar a posição adotada na decisão recorrida, julgando inconstitucional a interpretação conjugada das normas contidas no artigos 334.º do Código do Trabalho e no artigo 481.º, n.º 2, proémio, do Código das Sociedades Comerciais «na parte em que impedem a responsabilidade solidá- ria de sociedades com sede fora do território nacional, por créditos emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, de empregadores com as quais se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, por violação do princípio da não discriminação em razão da nacionalidade e da igualdade de tratamento, contido no artigo 13.º, n. os 1 e 2, da CRP».

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