TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

515 acórdão n.º 227/15 d) Não pode, no entanto, a Recorrente conformar-se com esta decisão, porquanto, independentemente da bon- dade ou justiça da norma contida no proémio do número 2 do artigo 418.º do Código das Sociedades Comerciais, questão diferente será a da sua compatibilidade com a Constituição da República Portuguesa. e) Para que uma determinada ato seja considerado inconstitucional, é necessário que se verifique um defeito ou uma deformidade nos pressupostos ou elementos do ato, gerada pela desconformidade deste com um parâ- metro constitucional. f ) Para aferir se em determinada situação se encontra violado o princípio da igualdade, haverá que ter em conta a sua dupla vertente, traduzida no brocardo habitualmente utilizado segundo o qual se deve “tratar de forma igual o que é igual, e de forma diferente o que é diferente”. g) A vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a sua liberdade de confor- mação legislativa, já que apenas ao legislador caberá, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações que devem funcionar como elementos de referência a tratar de forma igual ou desigual. h) No caso que para efeitos dos presentes autos releva, não se verifica qualquer violação do princípio da igualda- de, porquanto não estão em causa situações comparáveis que se possam considerar como iguais. i) Tendo como ponto de partida para esta comparação duas situações em que numa delas um grupo societário tem a sua sociedade-mãe situada em Portugal, e na outra um grupo semelhante tem a sua sociedade-mãe situada fora do território português, não se podem considerar tais situações como iguais, desde logo porque o ordenamento jurídico aplicável a ambas as sociedades-mãe é distinto. j) O regime regra do direito português é o da limitação da responsabilidade das sociedades comerciais por quo- tas – por regra só o seu património responde perante terceiros (artigo 197.º, n.º 3 do CSC). k) O artigo 334.º do CT tem a natureza de norma excecional face a tal princípio geral e só pode ser operaciona- lizado com a limitação constante do número 2 do artigo 481.º do CSC. l) Tal limitação é um corolário lógico-jurídico do preceituado no artigo 33.º do Código Civil – compete à lei pessoal das pessoas coletivas regular o regime da sua responsabilidade perante terceiros, sendo a lei pessoal a da respetiva sede. m) Assim, estando a matéria da responsabilidade por dívidas cometida à lei pessoal, não pode o legislador regular a responsabilidade por dívidas de sociedades cuja lei pessoal não seja a lei portuguesa. n) A ratiolegis do n.º 2 do artigo 481.º do CSC, e que esteve na base da criação deste elemento adicional de conexão espacial, reside no seguinte: estender a aplicação do regime das sociedades coligadas (e, consequente- mente, o regime de solidariedade) a sociedades com sede fora de Portugal configura uma invasão inaceitável da respetiva lei pessoal, vedada pelo artigo 33.º do Código Civil. o) Caso contrário, verificar-se-ia uma aplicação extraterritorial do direito português, que se imporia, injustifica- damente, a um ordenamento jurídico totalmente distinto. p) Por este motivo, falta ao caso em apreço uma condição essencial para que se pudesse verificar uma violação do princípio da igualdade constitucionalmente consagrado – a identidade de situações – uma vez que não se pode considerar que uma sociedade – mãe com sede em Portugal se encontre numa situação igual à de uma sociedade-mãe com sede na Alemanha. q) A razão de ser desta diferenciação criada pelo legislador decorre da natureza das coisas, do facto de às socieda- des em comparação serem aplicáveis regimes jurídicos distintos, desigualdade de facto à qual o legislador não pôde ser indiferente. r) Sintomático da conformidade da regra contida no número 2 do artigo 481.º do CSC com a CRP é o facto de o seu proémio se manter inalterado desde a origem deste diploma, em 1986. s) A maioria da doutrina que se tem pronunciado sobre o tema, não obstante tecer críticas ao regime vigente de uma perspetiva de iurecondendo, não coloca em causa a sua compatibilidade com a Constituição. t) Também a doutrina juslaboralista conclui no sentido da inaplicabilidade do regime previsto no artigo 334.º do CT relativamente a sociedades com sede fora de Portugal.

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