TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

512 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL proibição do arbítrio – e não perante uma eventual descriminação. Estaremos perante uma ofensa ao princípio da proibição do arbítrio se e na medida em que se provar que a diferença de tratamento não tem a justificá-la um qualquer fundamento racional bastante. IV – Constituindo o princípio da igualdade uma «norma de controlo», não pode desconsiderar-se que «em sede de controlo da constitucionalidade, não cabe aos respetivos órgãos emitir propriamente um juízo “positivo” sobre a solução legal [...] o que lhes cabe [...] é tão-somente um juízo “negativo”, que afaste aquelas soluções legais de todo o ponto insuscetíveis de credenciar-se racionalmente». V – No caso que nos ocupa, o ponto decisivo para a ponderação da constitucionalidade está em apurar se existe fundamento material bastante para que um trabalhador, em Portugal, ao serviço de uma socie- dade comercial pertencente a um grupo e dominada por uma sociedade estrangeira com sede noutro país possa ter, no plano da garantia dos créditos emergentes da relação laboral, um tratamento menos favorável do que um outro trabalhador em Portugal ao serviço de uma sociedade comercial pertencen- te a um grupo e dominada por uma sociedade estrangeira com sede no nosso país. VI – Em abstrato o tratamento diferenciado a duas sociedades comerciais, uma com sede em Portugal, outra fora do país, nada tem de arbitrário, pois a diferenciação assenta na lei pessoal, determinada de acordo com a norma de conflitos portuguesa, a qual legitimaria, de alguma forma, o resultado da aplicação combinada dos artigos 334.º do Código do Trabalho e 482.º, n.º 2, do CSC, que seria a exclusão da responsabilidade da sociedade dominante com sede fora de Portugal. VII – Contudo, estando em causa o princípio da igualdade, indispensável é esclarecer o que é que estamos a comparar, em ordem a apurar qual é a diferenciação e, depois, proceder à ponderação desta; na verda- de, o que temos de comparar é a situação jurídico-laboral, no plano dos créditos emergentes desta, de dois trabalhadores portugueses, ao serviço de empresas portuguesas, trabalhando ambos em Portugal, sendo o único fator de diferenciação a circunstância de as empresas para que trabalham integrarem grupos económicos, tendo um deles a sociedade dominante sediada em Portugal e o outro a sociedade dominante sediada na Alemanha; é este fator de diferenciação que cumpre apreciar. VIII– No entender do Tribunal, este é o ponto fundamental: a diferenciação assim construída, fundada em situação cuja lógica escapa aos trabalhadores e que podem mesmo ignorar – em absoluto ou, pelo menos, quanto às suas implicações – não pode ser considerada «razoável, racional e objetivamente fundada», pois implica – e não poderia implicar – uma diferença de tratamento para a qual se não encontram motivos razoáveis e racionais; a distinção operada pelo legislador, na medida em que dife- renciou sem fundamento material bastante, não pode deixar de ser considerada contrária à Consti- tuição, por violação do princípio da não discriminação em razão da nacionalidade e da igualdade de tratamento.

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