TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

488 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL um direito à publicação do produto da criação cultural, mas é evidente que a sua utilização (para fins comerciais, industriais, publicitários, pedagógicos, etc.) cria um valor económico que cai também no âmbito de proteção do direito à criação cultural. De resto, o direito de propriedade intelectual, diretamente protegido pelo regime dos direitos, liberdades e garantias goza de uma proteção constitucional mais intensa do que o direito de propriedade sobre as coisas (art. 62.º)» (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2007, p. 622), tese, aliás, já acolhida neste Tribunal (cfr. Acórdão n.º 577/11): “(…) O bem jurídico tutelado por esta incriminação reside nosdireitos de autor, os quais se apresentam como valores constitucionalmente relevantes, nos termos dos artigos 42.º, n.º 2 e 62.º da Constituição. A tutela da propriedade intelectual apresenta-se, no plano da nossa Constituição, como uma tutela multifacetada. Com efeito, a propriedade intelectual é, antes de mais, propriedadeprivada, abrangida, portanto, no núcleo essencial do direito fundamental de propriedade, nos termos do artigo 62.º, n.º 1, da Constituição (nesse sentido se pronunciou já o Tribunal no Acórdão n.º 491/02, publicado no Diário da República , II Série, de 22 de janeiro de 2003). Mas a tutela dos direitos de autor não se consome na proteção que o Estado concede à propriedade. A Constituição estabelece, no capítulo II do Título respeitante aos direitos, liberdades e garantias, sob a epígrafe “direitos, liberdades e garantiaspessoais”, que a liberdade de criação cultural inclui aproteção legal dos direi- tos de autor. A propriedade intelectual surge, assim, integrada no âmbito do regime específico dos direitos, liberdades e garantias, beneficiando, portanto, de uma tutela mais intensa do que a que, em primeira linha, a Constituição reserva aos direitos económicos, sociais e culturais, enquadrados no Título III (ressalvando-se as devidas equiparações no caso dos direitos análogos, nos termos do artigo 17.º).(…)”. Ora, mesmo não se configurando formalmente os direitos em presença como «direitos de autor», certo é que as patentes são direitos (exclusivos) que se obtêm sobre invenções (soluções novas para problemas técnicos espe- cíficos), quer se trate de produtos ou processos (e aqui se incluindo os processos novos de obtenção de produtos, substâncias ou composições já conhecidos), pelo que, em grande medida, a patente corresponde à tutela dessa invenção. Assim, é de admitir, na perspetiva da respetiva tutela jurídico-constitucional, o concurso de direitos de criação cultural (científica), consagrados no artigo 42.º da Constituição. Acompanha-se aqui a reflexão de Gomes Canotilho (Cfr. Parecer sobre o Novo Regime Legal de Resolução de Litígios Patentários , policopiado, fls. 25-26): «Como princípio geral, pode, pois, dizer-se que o «direito à patente», isto é, o direito «a requerer a patente», pertence ao «criador intelectual ou aos seus sucessores», sendo que é naquele preceito que se determina «quem está legitimado a solicitar um pedido de patente de invenção em seu nome, vindo a figurar no pedido de registo como requerente do direito» 29 ( 29 Cfr. António Campinas e Luís Couto Gonçalves, Código da Propriedade Industrial, cit., pp. 215. e segs.). Em nosso entender, o «inventor» encontra-se legitimado ab initio , mesmo do ponto de vista jurídico-constitucional, para requerer a patente que lhe irá conferir o «exclusivo» do direito. Legitimação que lhe advém do fato de já lhe assistir um direito, concomitantemente pessoal e patrimonial, sobre a própria «invenção». O mesmo será dizer, em virtude de ser titular do «direito de troncalidade autoral», tendencialmente unificador do conteúdo essencial da Liberdade fundamental de criação cultural, constitucio- nalmente consagrada e que o legislador ordinário acabou por «dispersar» em sede de concretização sistemática- -normativa 30 ( 30 Cfr. José Joaquim Gomes Canotilho, “Liberdade e Exclusivo na Constituição”, in Estudos sobre Direitos Fundamentais , Almedina. Coimbra Editora, 2004, pp. 219 e segs.) Este princípio geral conformador do direito de «invenção» a patentear apresenta-se, no plano da lei ordinária, como uma manifestação ou coro- lário do direito/liberdade fundamental pessoal de «criação cultural» – criação cultural, artística e científica –, consagrado no artigo 42.º da Constituição da República Portuguesa 31 ( 31 Convém lembrar desde já, que, nos termos do n.º 1 do artigo 42.º da Constituição da República Portuguesa. «É livre a criação intelectual,

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