TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

477 acórdão n.º 216/15 47. Mesmo que subsistissem dúvidas sobre a proporcionalidade da opção do legislador, quando optou por um nível de proteção da propriedade industrial que não atingiu um grau ou patamar máximo, haverá sempre que considerar que o critério de decisão por aquele adotado procurou acautelar um regime jurídico balanceado, onde a garantia desse direito teve de ser equilibrada com a garantia de outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos. 48. Assim, a opção compromissória que resulta do EM na sua nova redação exunda da necessidade de: a) Compatibilizar a garantia do direito de propriedade industrial dos titulares de patentes dos medicamentos de referência, com a liberdade económica e de iniciativa privada dos titulares dos medicamentos genéricos; b) Evitar que a existência de um controlo preventivo em sede do procedimento da AIM, em benefício dos titulares de patentes dos medicamentos de referência, comprimisse desproporcionadamente a liberdade de iniciativa privada do titular do genérico, ao retardar desnecessariamente a sua introdução legal no mercado, a ponto de afetar o núcleo da sua garantia (a qual consistirá em salvaguardar em tempo útil e razoável a comercialização do produto). 49. Adicionalmente, também no contexto de ponderação de direitos e interesses que repousam, aliás, na expo- sição de motivos da lei sindicada, esta procurou alcançar um ponto de equilíbrio ente o nível de garantia do direito de propriedade industrial já anteriormente adotado pelo EM e a salvaguarda de outros direitos e valores constitu- cionalmente protegidos, tais como: a) A necessidade de redução expressiva das comparticipações financeiras do Estado com os medicamentos, como forma de redução impreterível do défice público num quadro de urgência, de forma a observar exi- gências imperiosas de equilíbrio financeiro constitucionalmente tuteladas (art.º 105.º da CRP). b) O imperativo de assegurar o cumprimento de obrigações internacionais do Estado nesse domínio, impondo-se elencar, a par das que decorrem das orientações da Medida 3.62 do Memorando de entendi- mento entre o Estado e o FMI, CE e BCE, (que fixa obrigações internacionais para a República Portuguesa no domínio da remoção de entraves à entrada de genéricos), também as que são impostas pelo direito europeu portador de eficácia direta vertical (mormente o artigo 126.º da Diretiva 2001/83/CE e o n.º 2 do artigo 81.º do Regulamento n.º 726/2004), de cuja violação decorreria, se aceite a interpretação sufragada pelas Recorrentes, a condenação do Estado por incumprimento de direito europeu e a sua responsabilidade civil extracontratual por danos causados; c) A garantia do direito fundamental dos cidadãos à proteção na saúde (n.º 1 do artigo 64.º da CRP,) numa situação excecional de carência de medicamentos em setores vulneráveis da população, a qual se deve con- jugar com a especial obrigação assumida constitucionalmente pelo Estado na “socialização dos custos dos cuidados médicos e medicamentos” [alínea c) do n.º 3 do artigo 64 da CRP]. 50. A consagração, pelas Recorrentes pretendida, de um nível mais intenso da proteção do direito de proprie- dade industrial, assente num controlo preventivo do requerimento em função da existência de patentes, e desenvol- vido no âmbito de um procedimento de AIM, violaria o princípio da igualdade, porquanto concederia às patentes de medicamentos de referência um regime de privilégio face a todas as demais patentes. 51. Tal nível de proteção contraditaria igualmente esse princípio da igualdade, na medida em que da intro- dução desse controlo decorreria uma discriminação negativa para os requerentes da comercialização de genéricos junto do INFARMED, em contraposição com outros requerentes titulares de AIM europeias ou obtidas noutros Estados, que teriam a faculdade de efetuar a comercialização da mesma substancia ativa em território português, sem terem de se submeter a esse controlo prévio de caráter preclusivo. 52. Em suma: ao contrário do que pretendem as Recorrentes, não padece de qualquer inconstitucionalidade a interpretação, feita pelo STA no Acórdão recorrido, segundo a qual as normas constantes dos n.º 1 e 2 do artigo 25.º e dos n.º 1 e 2 do artigo 179.º do mesmo diploma (na redação que lhes foi conferida pela lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro), bem como as normas constantes do n. os 3 e 4 do artigo 8.º da mesma lei n.º 62/2011, não

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