TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
476 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL utilizadores. Em caso algum tal concessão pode ser vista como tendo por objeto mediato a permissão para a infra- ção de uma patente. 37. Insistindo neste ponto: autorização para introdução no mercado é uma coisa; autorização para comercia- lização é outra, bem distinta. Aquela permite que o medicamento possa vir a ser colocado no mercado, por força das características intrínsecas que apresenta, no momento em que a patente caducar. Esta autoriza a sua comercia- lização efetiva. Aquela decorre de um procedimento administrativo em que o produto é técnico-cientificamente testado e exige a emissão do correspondente ato administrativo. Esta decorre diretamente da lei, que apenas a permite a partir do momento da caducidade da patente, cuja duração é de 20 anos. 38. Não cabendo ao INFARMED qualquer dever de prevenção de riscos ou de hipóteses probabilísticas de violação da garantia de propriedade industrial derivada do mau uso que os particulares possam fazer de uma AIM, não é possível sustentar que a norma legal que garante a necessária abstenção do INFARMED na realização dessa atividade preventiva viabilize a lesão do direito da propriedade industrial ou a prática de atos criminosos por parte de atos autorizativos que, em si mesmos, se mostram insuscetíveis de lesar desses direitos. 39. Improcedem pois as razões de inconstitucionalidade invocadas em relação à nova redação dada ao n.º 8 do artigo 19.º e ao artigo 25.º do Decreto-lei n.º 176/2006, pelo artigo 4.º da lei n.º 62/2011 em eventual conjugação com o artigo 9.º, na medida em que a mesma não habilita os particulares à violação de direitos nem à prática de outros atos ilícitos. 40. Se não se verifica qualquer violação de direitos, por maioria de razão se não poria em crise um suposto direito fundamental à garantia dos direitos fundamentais, pois que, ainda que este decorresse da lei fundamental – coisa que, como se notou já, não ocorre –, não se tornaria aqui operativo, precisamente pelo facto de, inexistindo desconsideração de um direito, nada haver a garantir. 41. Por paralelismo parcial de razão argumentativa, deve ser excluída da esfera da DGAE, no que concerne ao procedimento de aprovação do preço de venda ao público do medicamento genérico, a existência de idêntica obri- gação de esse órgão administrativo ter de exercer um controlo preventivo sobre a eventual subsistência de direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência. 42. Se a AIM não é, por si só, apta a ferir qualquer direito de propriedade industrial, não é necessário, nem se justifica, que ao ato de concessão da AIM seja aposto, como defendem as Recorrentes, um termo suspensivo, de acordo com o qual a AIM só produziria efeitos a partir do dia x , data que corresponderia ao momento da caduci- dade da patente. 43. Acresce que, no que toca à possibilidade de comercialização do produto, a concessão da AIM contém, por natureza, uma cláusula implícita de diferimento da sua eficácia, na medida em que tal comercialização só pode ocorrer após a caducidade da patente, pois que só produz todos os efeitos a que se destina no momento em que a comercialização se torna possível, isto é, aquando da caducidade da patente do medicamento de referência. Até lá, a AIM só significa que o medicamento genérico tem condições técnico-científicas para ser comercializado. Mas, por decorrência do disposto na própria lei [n.º 1 do artigo 14.º do EM], só no momento em que a patente caduca é que o fim último a que a AIM se destina pode ser atingido – a efetiva disponibilização aos utentes desse produto. 44. O legislador não está vinculado pelo artigo 62.º da CRP da Constituição a assegurar um nível de proteção máximo da patente, sustentado num controlo administrativo prévio da existência de direitos de propriedade indus- trial a exercer pelo INFARMED no procedimento de concessão da AIM. 45. A lei n.º 62/2011 logra assegurar aos titulares das patentes, a par de uma garantia jurisdicional efetiva, decorrente do disposto do seu artigo 2.º e demais legislação (mormente a que prevê a responsabilização civil e cri- minal da violação do direito de propriedade industrial), um relevante sistema aviso prévio que implica a publicação na página eletrónica do INFARMED de todos os pedidos de autorização e registo de introdução de genéricos (art.º 15.º-A, aditado ao EM pelo artigo 5.º da mesma lei). 46. O nível de proteção consagrado pela legislação aplicável ao direito de patente resulta ser suficiente e consti- tucionalmente adequado, não ofendendo o conteúdo da garantia da propriedade privada constante do artigo 62.º da CRP.
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