TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

460 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL porque ela só produz efeitos plenos quando tenha expirado o prazo decorrente do “direito de paten- te” respetivo. Assim, mesmo que o competente órgão do Infarmed concedesse uma AIM relativa a medicamento cujo “direito de patente” estivesse ainda sob proteção, essa decisão não seria apta a afe- tar, de modo concreto e efetivo, o direito das ora recorrentes, pois apenas findo o prazo de proteção da patente ficam os beneficiários daquela AIM autorizados a exercê-la plenamente; por essa razão, a interpretação acolhida pela decisão recorrida não ofende o “direito à propriedade industrial”. III – Ainda que se admitisse que a mera concessão de uma AIM, sem comercialização efetiva, já seria apta a comprimir o “direito à criação científica” e o “direito à propriedade privada”, sempre se imporia reconhecer que essa compressão (mínima) do âmbito máximo daquele “direito à propriedade privada” estaria justificada pela necessidade de proteção de outros bens jurídicos constitucionalmente protegi- dos, desde logo, o “direito à iniciativa privada” das empresas concorrentes – e, em particular, as empre- sas produtoras e comercializadoras de medicamentos genéricos – e igualmente, o próprio “direito à saúde” por parte dos indivíduos que carecem do acesso a medicamentos a preços mais baixos. IV – Não se devendo configurar nenhum direito fundamental como absoluto e irrestringível em face de outros direitos fundamentais igualmente tutelados pela Constituição, a interpretação normativa ora em análise, ao determinar que não cabe ao Infarmed o controlo, em sede de procedimento administrativo de conces- são de AIM, de uma alegada violação do “direito de propriedade industrial”, não está a amputar, de modo definitivo, o exercício desse mesmo direito de defesa; em primeiro lugar, porque a circunstância de o titu- lar de um direito a patente não poder discutir a alegada violação do seu “direito de propriedade industrial” naquela sede não o impede de reagir, jurisdicionalmente, contra os potenciais infratores, designadamente através de um pedido de constituição de tribunal arbitral; em segundo lugar, porque o próprio Código da Propriedade Industrial (CPI) tipifica como crime essa ofensa ao referido “direito de propriedade indus- trial”, facultando o Estado ao titular do direito de patente os meios indispensáveis à defesa dos seus direi- tos; em terceiro lugar, porque, nos termos da alínea c) do artigo 102.º do CPI, nem nos casos de exclusão da proteção do direito de exclusividade resultante da patente se pode iniciar “a exploração industrial ou comercial desses produtos antes de se verificar a caducidade da patente que os protege”. V – Em suma, a interpretação normativa extraída da conjugação entre os artigos 25.º, n. os 1 e 2, e 179.º, n. os 1 e 2, do Estatuto do Medicamento, no sentido de o órgão administrativo competente não dispor de poderes legais para recusar a concessão de AIM a um medicamento, com fundamento numa alega- da violação de direitos de propriedade industrial, não afeta o conteúdo essencial do direito à criação científica nem do direito à propriedade privada, nem tão pouco comporta uma restrição despropor- cionada desses mesmos direitos. VI – As mesmas ponderações são válidas para o artigo 8.º, n.º 3, da Lei n.º 62/2011, quando interpretado no sentido de proibir que o INFARMED afira, no contexto do processo de autorização do preço de venda ao público, da violação de direitos de propriedade industrial por parte do medicamento objeto desse procedimento, obrigando-o, desse modo, a deferir requerimentos de aprovação de PVP para medicamento violador desses direitos ou impedindo-o de alterar, suspender ou revogar um PVP com fundamento na violação dos mesmos direitos por parte do medicamento dela objeto. VII – Tendo chegado à conclusão que não se verifica a violação de qualquer direito, liberdade e garantia, ou de direito de natureza análoga, mostra-se prejudicada a discussão da questão da eventual ofensa ao artigo 266.º da Constituição.

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