TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
451 acórdão n.º 204/15 atribuições, por via de ação inspetiva, de modo a promover a regularização da utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações de trabalho subordinado, bem como participar as infrações à Segurança Social, Administração Tributária e Aduaneira e ao Ministério Público. A isto acresce que, tal como atualmente, o traba- lhador poderia também recorrer à via judicial no sentido de ver regularizada uma situação de dissimulação do contrato de trabalho, através de uma ação de processo comum (cfr., a este respeito, Pedro Petrucci de Freitas, ob. cit., pp.1426-1427).» Tendo em conta este enquadramento do regime instituído pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto, bem como os seus antecedentes legislativos, importa agora apreciar as questões de constitucionalidade em causa nos autos. 2.1. Da violação dos princípios do Estado de direito democrático, da liberdade de escolha do género de trabalho e da igualdade Conforme se referiu, a inconstitucionalidade das normas objeto do presente recurso foi recentemente apreciada no Acórdão n.º 94/15, proferido por esta 2.ª secção, em que se concluiu pela sua não inconstitu- cionalidade, considerando-se não haver violação dos princípios do Estado de direito democrático, da liber- dade de escolha do género de trabalho e da igualdade, parâmetros que tinham sido invocados pela decisão recorrida como fundamento da recusa de aplicação das aludidas normas. Assim, uma vez que, no que respeita à apreciação da inconstitucionalidade de tais normas com base nestes fundamentos, a questão de constitucionalidade objeto do presente recurso é em tudo semelhante à que foi apreciada no referido Acórdão n.º 94/15, remete-se para a respetiva fundamentação e, reiterando-se o entendimento aí expresso, conclui-se que as normas constantes dos artigos 26.º, n.º 1, alínea i) , e 186.º-K a 186.º-R, todos do CPT, não violam os princípios do Estado de direito democrático, da liberdade de escolha do género de trabalho e da igualdade. 2.2. Da violação do direito à liberdade e do princípio da liberdade de iniciativa económica privada Segundo a decisão recorrida, o regime da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho traduz-se na imposição de uma ação declarativa, que deverá prosseguir independentemente e até contra a vontade do trabalhador, o que viola o princípio da liberdade contratual e da autonomia privada, consagrados no artigo 405.º do Código Civil, que «é corolário dos princípios constitucionais da liberdade (artigo 27.º) e da iniciativa privada (artigo 61.º), conformadores da unidade do sistema jurídico e subjacentes ao Estado de direito democrático (artigo 2.º)». Ainda de acordo com a referida decisão, o regime desta ação representa uma «intromissão do Estado em matéria que contende com a liberdade contratual, obrigando os contraentes a litigar, mesmo que não exista qualquer conflito», violando, por isso, «os Princípios Fundamentais do Estado de direito democrático, da Liberdade e da Iniciativa Privada consagrados respetivamente nos artigos 2.º, 27.º e 61.º da CRP». A decisão recorrida invoca a violação, além do mais, do artigo 27.º da Constituição, no qual, sob a epígrafe «Direito à liberdade e à segurança» se estabelece, no n.º 1 que «[t]odos têm direito à liberdade e à segurança». Conforme refere o Ministério Público nas suas alegações e como resulta claro também dos n. os 2 e 3 do referido artigo 27.º, o que está aqui em causa é o direito à liberdade física, à possibilidade de movimentação sem constrangimentos. Tutela-se aqui, conforme tem sido consensualmente reconhecido, um aspeto parce- lar e específico das diversas dimensões em que se manifesta a liberdade humana, o direito à liberdade física, entendida «como liberdade de movimentos corpóreos, de “ir e vir”, a liberdade ambulatória ou de locomo- ção» (cfr. Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra Edi- tora, 2010, p. 638) ou como «direito de não ser detido, aprisionado, ou de qualquer modo fisicamente confi- nado a um determinado espaço, ou impedido de se movimentar» (cfr. J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2007, p. 478). É este
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