TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

440 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – Do mesmo modo, não se vislumbra que o regime processual previsto para a ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho viole, em qualquer das aludidas dimensões, o direito a um pro- cesso equitativo; com efeito, embora esta ação tenha início mediante o impulso processual do Minis- tério Público, tenha natureza urgente e tenha em vista a proteção de determinados interesses públicos, aspetos que têm influência na modelação do seu regime, este não deixa de permitir a possibilidade de intervenção, quer do empregador, quer do trabalhador, garantindo-lhes ainda o direito à apresenta- ção de prova, o direito ao recurso, bem como o respeito de outros direitos processuais essenciais, tais como, o direito à igualdade de armas, ao contraditório, à fundamentação das decisões e a um processo orientado para a justiça material. V – Não se afigura que o regime da ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho viole o direito a um processo equitativo, pois o que se pretende com o regime da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é combater a utilização indevida do contrato de prestação de serviço nas situações em que, apesar de determinada relação ser formalmente titulada pelas partes como contrato de prestação de serviço, corresponda, substancialmente, a uma situação de trabalho subordinado, à qual deveria, por isso, ser aplicado o regime laboral – sendo este o interesse público subjacente à atuação do Ministério Público nesta matéria, não se verifica um caso de utilização inde- vida do contrato de prestação de serviços nos casos em que o trabalhador não pretenda, efetivamente, estar sujeito a uma relação jurídica de natureza laboral. VI – Sendo inquestionável que a autonomia do Ministério Público constitui um traço essencial na defini- ção desta magistratura como um órgão de administração de justiça, tem sido entendimento do Tribu- nal Constitucional que a garantia da autonomia do Ministério Público tem o seu campo de eleição no âmbito do processo penal; ora, estando-se no caso concreto perante uma intervenção do Ministério Público na área da jurisdição laboral, é de entender que, face aos interesses em causa, a atuação pro- cessual do Ministério Público neste campo não reclama uma autonomia com um grau de intensidade idêntico ao que é exigido no âmbito do exercício da ação penal. VII – No caso dos autos, mesmo que se admita que, na sequência da participação efetuada pela Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), o Ministério Público tem necessariamente de instaurar a ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, tal não basta para se concluir que o regime legal em causa seja violador do princípio da autonomia do Ministério Público, pois, uma vez iniciado o processo, não resulta do regime jurídico em causa qualquer condicionamento à atuação posterior do Ministério Público, que manterá incólume a sua autonomia, podendo assumir, designadamente, em fases posteriores do processo e em resultado da prova produzida, uma posição não coincidente com que a determinou a propositura da ação na sequência da participação da ACT, posição essa baseada em estritos critérios de legalidade e de objetividade, não violando o regime normativo em causa o princípio da autonomia do Ministério Público.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=