TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

435 acórdão n.º 194/15 princípio da igualdade, a correção dos desequilíbrios orçamentais tem necessariamente que ser levada a cabo por via tributária, pelo aumento da carga fiscal, em detrimento de medidas de redução remuneratória. Será assim? É indiscutível que, com as medidas em apreciação, a repartição dos sacrifícios impostos pela situação excecional de crise financeira não se faz de igual forma entre todos os cidadãos com igual capacidade contributiva, uma vez que elas não têm um alcance universal, recaindo apenas sobre as pessoas que têm uma relação de emprego público. Há um esforço adicional em benefício de todos, em prol da comunidade, que é pedido exclusivamente aos servidores públicos. Também não sofre controvérsia que não estava excluída a tomada de medidas de natureza tributária, condu- centes à obtenção de uma receita fiscal de montante equivalente ao que se poupa com a redução remuneratória. E, nessa hipótese, todas as pessoas que auferem iguais rendimentos coletáveis ficariam sujeitas a um igual sacrifício do ponto de vista da sua contribuição para os encargos públicos. Mas esta dupla constatação de forma alguma equivale à fundamentação do cabimento do princípio da igual- dade perante os encargos públicos, quando se trata de apreciar a constitucionalidade de medidas estaduais que visam a contenção do défice orçamental dentro de determinados limites. A fundamentação de que aquele princípio tem uma projeção constringente nesta matéria (não como princípio estruturante, mas como princípio impositivo do sistema fiscal), predeterminando o tipo de soluções disponíveis e retirando ao decisor político democratica- mente legitimado qualquer margem de livre opção, é algo que fica por fazer. E esse ónus de fundamentação teria que ser satisfeito, pois a definição dos encargos públicos e dos seus limites − o que está aqui em causa – situa-se a montante da questão da sua repartição, sem com ela se confundir. O princípio constitucional da igualdade perante os encargos públicos não pode, pois, ser automaticamente transposto, sem mais, para este campo problemático. É sabido que a atuação, em combate ao défice, pelo lado da receita (privilegiadamente fiscal), ou, antes, pelo lado da despesa (bem como a combinação adequada dos dois tipos de medidas e a seleção das que, de entre eles, merecem primazia) foi (e continua a ser) objeto de intenso debate político e económico. (…) Não cabe, evidentemente, ao Tribunal Constitucional intrometer-se nesse debate, apreciando a maior ou menor bondade, deste ponto de vista, das medidas implementadas. O que lhe compete é ajuizar se as soluções impugnadas são arbitrárias, por sobrecarregarem gratuita e injustificadamente uma certa categoria de cidadãos. Não pode afirmar-se que tal seja o caso. O não prescindir-se de uma redução de vencimentos, no quadro de distintas medidas articuladas de consolidação orçamental, que incluem também aumentos fiscais e outros cortes de despesas públicas, apoia-se numa racionalidade coerente com uma estratégia de atuação cuja definição cabe ainda dentro da margem de livre conformação política do legislador. Intentando-se, até por força de compromis- sos com instâncias europeias e internacionais, conseguir resultados a curto prazo, foi entendido que, pelo lado da despesa, só a diminuição de vencimentos garantia eficácia certa e imediata, sendo, nessa medida, indispensável. Não havendo razões de evidência em sentido contrário, e dentro de “limites do sacrifício”, que a transitoriedade e os montantes das reduções ainda salvaguardam, é de aceitar que essa seja uma forma legítima e necessária, dentro do contexto vigente, de reduzir o peso da despesa do Estado, com a finalidade de reequilíbrio orçamental. Em vista deste fim, quem recebe por verbas públicas não está em posição de igualdade com os restantes cidadãos, pelo que o sacrifício adicional que é exigido a essa categoria de pessoas – vinculada que ela está, é oportuno lembrá-lo, à prossecução do interesse público – não consubstancia um tratamento injustificadamente desigual». À norma aqui em apreciação, extraída dos artigos 19.º, n.º 9, alínea t) , 24.º, n. os 1, 2 e 16, da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, na medida em que determina, imperativamente, a proibição de paga- mento de diuturnidades a trabalhadores das empresas de capital exclusiva e maioritariamente público, origi- nando a diminuição do valor remuneratório que os mesmos teriam direito a receber, aplicam-se as considera- ções expendidas no Acórdão n.º 396/11 e o consequente juízo de não inconstitucionalidade nele formulado. Na verdade, como já se considerou no Acórdão n.º 237/14, não tendo este Tribunal, reunido em Ple- nário, considerado inconstitucional a redução do quantum remuneratório definida pelo artigo 19.º da Lei do Orçamento para 2011, “também não será inconstitucional impedir o seu aumento”. Conclui-se, desta forma, que a não inconstitucionalidade da vedação de valorizações remuneratórias, nos termos do artigo 24.º, “decorre de um argumento de maioria de razão”.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=