TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
402 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e punido no artigo 227.º do Código Penal, e que este preceito faz depender o preenchimento do tipo legal da verificação do resultado (situação de insolvência) e de uma condição de punibilidade (o reconhecimento judicial da insolvência), ao passo que a norma do artigo 227.º-A veio cominar a sanção penal quando, tendo sido instaurada a ação executiva, nela não se conseguir satisfazer inteiramente os direitos do credor. Assim concluindo que, em contrário da diretiva estabelecida pela lei de autorização legislativa, os ele- mentos do tipo são mais restritivos no crime de insolvência dolosa do que no crime de frustração de créditos. O artigo 227.º-A do Código Penal, aditado pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março, sob a epígrafe «Frustração de créditos», consigna o seguinte: «1 – O devedor que, após prolação de sentença condenatória exequível, destruir, danificar, fizer desaparecer, ocultar ou sonegar parte do seu património, para dessa forma intencionalmente frustrar, total ou parcialmente, a satisfação de um crédito de outrem, é punido, se, instaurada a ação executiva, nela não se conseguir satisfazer inteiramente os direitos do credor, com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa. 2 – É correspondentemente aplicável o disposto nos números 3 e 5 do artigo anterior.» O Decreto-Lei n.º 38/2003, que introduziu no ordenamento jurídico este novo tipo legal, foi emi- tido ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 23/2002, de 21 de agosto, que «autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Civil no que respeita à ação executiva», e que inclui, no seu artigo 11.º, uma autorização para a criminalização da «frustração de execução» nos seguintes termos: «1 – Fica o Governo autorizado a criminalizar o comportamento do devedor que, após prolação de sentença condenatória exequível, destruir, danificar, fizer desaparecer, ocultar ou sonegar parte do seu património, para dessa forma intencionalmente frustrar, total ou parcialmente, a satisfação do direito do credor, em termos equivalentes ao crime de insolvência dolosa, previsto e punido pelo artigo 227.º do Código Penal. 2 – Fica também o Governo autorizado a sujeitar o executado que, tendo bens, omita declarar que os tem a sanção pecuniária compulsória a definir pelo decreto-lei autorizado.» Através da fórmula verbal adotada no n.º 1 do artigo 11.º da lei de autorização legislativa («em termos equivalentes ao crime de insolvência dolosa»), o legislador parlamentar, para efeito de responsabilidade penal, pretendeu assimilar ao crime de insolvência dolosa o comportamento do devedor que, de forma intencional, frustrar a satisfação do direito do credor, e esse propósito ficou também expresso nos trabalhos preparatórios e, especialmente, no debate na reunião plenária de 19 de junho de 2002, em que se procedeu à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 9/XI, que originou a aprovação da Lei n.º 23/2002 ( Diário da Assembleia da República , I Série, n.º 21, de 20 de junho de 2002). Por sua vez, o tipo objetivo da insolvência dolosa, previsto no artigo 227.º do Código Penal, consiste na prática de certos atos de diminuição real do património do devedor, diminuição fictícia do seu património líquido e de ocultação da situação patrimonial real, praticados com intenção de prejudicar os credores, e que é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias, «se ocorrer a situação de insol- vência e esta vier a ser reconhecida judicialmente». Como vem sendo reconhecido pela doutrina, o resultado típico da insolvência dolosa é o da criação de uma situação de impotência económica ou de estado de insolvência, sendo que a declaração judicial de insol- vência é uma condição objetiva de punibilidade (Pedro Caeiro, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo II, dirigido por Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 1999, pp. 421 e 425; Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, Universidade Católica Editora, pp. 626-627). 3. Como é sabido, é da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, legislar sobre a «definição de crimes, penas, medidas de segurança e respetivos pressupostos, bem
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=