TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

401 acórdão n.º 125/15 3. O artigo 227.º do Código Penal punia (então) com pena de prisão até três anos ou pena de multa a prática do crime de insolvência dolosa, do que dependia (1) a ocorrência da situação de insolvência e (2) o seu reconhe- cimento judicial. 4. Ora, a norma do artigo 227.º-A veio cominar a sanção penal de prisão três anos ou pena de multa se instau- rada a ação executiva, nela não se conseguir satisfazer inteiramente os direitos do credo. 5. A norma do artigo 227.º-A, acrescentado ao Código Penal por diploma emanado no uso de autorização legislativa, deveria respeitar o limite material daquela autorização. 6. Verifica-se, porém, que o resultado (situação de insolvência) e a condição de punibilidade (o reconhecimento judicial da insolvência) que integram o tipo do artigo 227.º são inequivocamente mais restritivas do que o que se consagrou no (então novo) artigo 227.º-A. 7. A norma do artigo 227.º-A do Código Penal enferma, assim, de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 112.º, n.º 2 e, 165.º, n.ºs 1 al. c) e n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. 8. Mas mesmo que não existisse tal contradição entre a formação do tipo e a condição de punibilidade como preconizado pela Autorização Legislativa ainda assim seria sindicável quanto à sua conformidade constitucional, e pois que 9. A reserva de lei é precedida da reserva de constituição e mesmo esta se deverá normalmente conformar à dita reserva de direito, valendo isto por dizer que o poder legislativo se deve conformar com os princípios constitucio- nais, interpretados em coerência com o primado e a abrangência dos princípios do Estado de direito democrático e com os princípios de direito internacional geral ou comum que a Constituição afirma e integra. 10. E tais princípios, como resultam da densificação doutrinária dos artigos 18.º, 27.º e 29.º da CRP, justificam que se exija à norma habilitante e à norma autorizada, que os pressupostos de incriminação se validem substancial e processualmente face ao tribunal criminal competente, e também que, em caso de dúvida legítima, se entenda restritamente os elementos in malem da previsão criminal 11. E, por isso, face à norma penal em questão, se não se quiser entender o tipo e a condição de punibilidade em conformidade estrita com a norma habilitante, teremos de, com as mesmas consequências, entender que a frus- tração intencional de crédito de outrem, como resultado necessário da conduta e por isso como elemento do tipo incriminador, só se pode considerar verificada se existirem, à data da conduta incriminável, as condições fácticas e legais da insolvência. Nestes termos, e nos mais do direito aplicável e do mui douto suprimento, deve o presente recurso merecer provimento, sendo declarada a inconstitucionalidade material da norma do artigo 227.º-A do Código Penal.» O Procurador-Geral Adjunto junto do Tribunal Constitucional contra-alegou, pronunciando-se pela improcedência do recurso, por considerar que o novo tipo legal instituído pelo artigo 227.º-A, não violou os limites materiais da autorização legislativa conferida pela Lei n.º 23/2002, de 21 de agosto, na medida em que esta Lei pressupunha a criminalização da frustração de créditos «em termos equivalentes» ao previsto para a insolvência dolosa, a que se refere o precedente artigo 227.º Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 2. O recorrente coloca a questão da inconstitucionalidade orgânica, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , e do n.º 2, da Constituição, da norma do artigo 227.º-A do Código Penal, aditada pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março, invocando que esse dispositivo, que institui o crime de «frustração de créditos», não respeitou os limites materiais da autorização legislativa conferida pela Lei n.º 23/2002, de 21 de agosto. Argumenta que, nos termos do artigo 11.º da Lei n.º 23/2002, de 21 de agosto, o Governo ficou auto- rizado a criminalizar a frustração de créditos em termos equivalentes ao crime de insolvência dolosa, previsto

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