TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
397 acórdão n.º 124/15 das decisões, o que se torna particularmente relevante quando essa exigência é necessária para permitir às partes discernir os ónus processuais de reação que lhe são impostos e as consequências da sua inobservância (cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, I vol., 4.ª edição, Coim- bra, pp. 415-416). No caso vertente, todas as considerações anteriormente expendidas e que se sintetizaram nos preceden- tes n. os 9 e 10, e, particularmente, a dúvida pertinente quanto à interpretação dos textos legais, a inaplica- bilidade ao caso do regime previsto para a prolação de decisão sumária, a ausência de suficiente explicitação quanto ao uso de competência decisória como juiz relator, a imprevisibilidade do ónus processual imposto à parte face à prática jurisprudencial existente à data da interposição do recurso, o caráter excessivamente gravoso da consequência cominatória resultante da inobservância do ónus, e a desculpabilidade da conduta processual da parte, apontam para considerar que a interpretação normativa adotada pela decisão recorrida viola o princípio do processo equitativo em conjugação com os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança. Sendo certo que, na situação do caso concreto, os apontados fatores de incerteza intraprocessual foram potenciados pelo facto de a sentença ter sido proferida por tribunal administrativo e fiscal, em juiz singular, com base na mera invocação nominal dos poderes conferidos pelo artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, independentemente da verificação dos pressupostos de prolação de decisão sumária e de qualquer suficiente fundamentação, pelo que também se refletem na dimensão normativa que constitui objeto do recurso. 13. No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 846/13, analisando a mesma interpretação normativa do artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , e n.º 2, do CPTA que está aqui em causa, formulou-se um juízo de não inconstitucionalidade, mas por referência ao direito ao recurso enquanto expressão do princípio da tutela jurisdicional efetiva, afastando-se expressamente a apreciação da questão à luz dos princípios da segurança jurídica e da confiança por não terem sido objeto do requerimento de interposição de recurso. OTribunal argumentou que, «segundo a interpretação sindicada, a parte vencida não pode interpor recurso da decisão singular do relator, mas pode reclamar dela para a conferência, o que lhe assegura uma segunda apre- ciação da questão por uma formação do mesmo tribunal com uma composição alargada e não lhe elimina o direito de posteriormente interpor recurso para um tribunal superior desta segunda apreciação». Assim – acrescenta-se –, «a exigência de reclamação para a conferência, não só não impede a intervenção de um segundo grau de jurisdição, como reforça o número de reapreciações das questões em discussão, pelo que não tem qualquer fundamento a invocação duma violação ou sequer duma restrição do direito ao recurso». Sem dúvida que não há, neste contexto, uma violação do direito ao recurso – que tinha sido também invocado pela recorrente como parâmetro de constitucionalidade no presente caso –, nem é possível questio- nar, nessa perspetiva, o entendimento expresso nesse outro Acórdão. A reclamação para a conferência, em si, não prejudica nem preclude a possibilidade de interposição de recurso, que sempre poderá ser dirigido ao tribunal hierarquicamente superior contra a decisão tomada em conferência que tenha confirmado o julgado pelo relator. A questão é que a exigência formal de prévia reclamação para a conferência em processo de primeira instância em contradição com a orientação jurispru- dencial existente à data em que o interessado exerceu o direito de recurso põe em causa a previsibilidade do ónus processual. Além de que o incumprimento dessa exigência, por efeito da discrepância dos prazos apli- cáveis em relação a cada um dos mecanismos processuais em presença, traz uma consequência irremediável e desproporcionada à gravidade da falta, tornando na prática inviável o direito a uma reação jurisdicional contra a decisão. No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 749/14 também se considerou que a impossibilidade de convolação do recurso em reclamação para a conferência não suscita uma questão de constitucionalidade, na medida em que «a observação tempestiva do prazo inerente ao meio de reação a que haveria de se ter lançado mão, é uma consequência necessária e equilibrada em face da falta de diligência processual do recorrente na seleção do meio processual adequado e no cumprimento do prazo a que tal meio se encontra sujeito». O
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=