TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

366 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Além disso, sendo as concretas providências cautelares que motivaram a decisão recorrida – e, assim, a interpretação ora sindicada – dirigidas apenas à empresa recorrida (e não a terceiros) e com vista à absten- ção de comportamentos relativos a medicamentos genéricos (e, in casu , também à transmissão de AIM), os assinalados limites inerentes à tutela cautelar em sede de arbitragem necessária não se afiguram, no caso em análise, determinantes no exercício do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva. De facto, apenas poderia relevar, in casu , a situação de um eventual incumprimento da medida cautelar pela ora demandada, o que em face da falta de poderes para a execução coerciva das providências cautelares sempre seria – por força da aplicação subsidiária, em última análise, do regime geral da arbitragem voluntária – da competência do tribunal estadual competente, assim assegurando aquele direito (cfr. artigo 3.º, n.º 8, in fine , da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro e artigo 27.º, n.º 1, da Lei de Arbitragem Voluntária aprovada em anexo à Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro). Por último, acresce referir ainda que, nos presentes autos, a questão da tutela cautelar enquanto não se encontra constituído (e em funcionamento) o tribunal arbitral necessário não se afigura determinante de molde a se poder concluir pela desconformidade da interpretação normativa sindicada em análise. Desde logo porque, in casu , como decorre dos autos, o recorrente não promoveu sequer a constituição de tribunal arbitral necessário para a resolução do litígio emergente da invocação do seu direito de proprie- dade industrial relacionado com medicamentos de referência e medicamentos genéricos. Também porque, em geral, a necessidade de tutela cautelar antes da constituição – que deve ocorrer em prazos curtos – do tribunal arbitral necessário configurará uma situação excecional no quadro do regime legal instituído já que a comercialização e venda de medicamentos genéricos depende de prévia concessão de AIM – cujo prazo (210 dias) terminará em regra após o decurso dos prazos legalmente previstos para a arbitragem necessária. E, finalmente, porque, em casos anómalos de comportamentos desconformes com a lei, nomeadamente a pro- dução e comercialização não autorizada de medicamentos genéricos, os titulares do direito de patente sempre poderão dirigir-se à entidade competente para a emissão de AIM relativa a medicamentos genéricos, para que esta adote, no âmbito das suas competências, as medidas que entenda serem adequadas, nomeadamente atra- vés do recurso aos tribunais competentes [cfr. em especial artigos 3.º, n.º 2, alínea b), e 5.º, n.º 2, alíneas e) a h) e m) e n) , do Decreto-Lei n.º 46/2012, de 24 de fevereiro] – e, no limite, lançar mão dos meios processuais gerais principais à sua disposição, como é o caso do previsto no artigo 37.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Com efeito, verificados os requisitos da utilização do meio processual previsto naquela disposição do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, poderá igualmente o particular titular do direito de patente, mesmo na pendência da constituição de tribunal arbitral necessário, pedir ao tribunal administrativo competente que condene outro particular (requerente de AIM ou mesmo sem essa qualidade) que produza ou comercialize medicamentos genéricos, sem fundamento em ato administrativo impugnável (por ainda não ter sido concedida a necessária AIM), a abster-se dos comportamentos contrários à lei suscetíveis de pôr em causa os seus direitos ou interesses decorrentes de uma patente concedida, também ela configurando um ato administrativo. Pelo exposto, a dimensão normativa perfilhada pela decisão recorrida no caso concreto, resultante do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro, segundo a qual o titular de direito de propriedade indus- trial apenas pode recorrer à arbitragem necessária, precludindo o recurso direto ao tribunal judicial no que se refere a providência cautelar, não se afigura desconforme com o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º, n. os 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa. B2) A segunda questão 13. A segunda interpretação normativa cuja constitucionalidade é impugnada é delimitada pelas recor- rentes nos seguintes termos: as normas constantes dos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezem- bro, interpretadas no sentido «que o titular de direito de propriedade industrial não pode demandar o titular

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