TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

364 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL arbitragem podem pactuar nesta que o tribunal arbitral poderá decretar providências cautelares, desde que tais providências se dirijam a uma das partes do processo arbitral e não impliquem o exercício de ius imperii (sistema de “opt-in” ). (…) Há de, porém, ser sempre possível às partes recorrer aos tribunais estaduais enquanto não estiver constituído o tribunal arbitral, sob pena de se frustrar a exigência de celeridade, sendo indispensável a intervenção do tribunal estadual quando devam ser aplicadas medidas que impliquem o exercício de poderes de autoridade, nomeadamente quando os destinatários sejam terceiros ou quando tenham de ser executadas pela força certas medidas cautelares (restituição provisória da posse; arresto, nomeadamente quando recaia sobre bens registáveis, em que a indispo- nibilidade resulta da inscrição do arresto no registo, tal como sucede com a penhora; suspensão de execução de deliberações sociais, dado que a sociedade fica impedida de as executar a partir da citação, etc.)». Também, tendo presente a natureza e finalidades específicas da tutela cautelar, conclui Paula Costa e Silva [“A arbitrabilidade (…), cit. ] que «(…) a solução que melhor pode acautelar os interesses da parte requerente de uma providência é a que aceita uma competência concorrencial entre tribunal arbitral e tribu- nal estadual. Com efeito, a natureza urgente das medidas cautelares deve impor o menor número possível de obstáculos de ordem formal à respetiva apreciação. Por esta razão, não deve impor-se, aquando da apreciação liminar da admissibilidade da providência, a questão da competência do tribunal como uma grande questão. Ora, se pensarmos v. g. que o tribunal arbitral não tem competência para decretar medidas que impliquem o exercício de poderes de autoridade, recaindo, consequentemente, esta competência cautelar na esfera dos tribunais estaduais, encontrámos um ponto problemático na determinação da competência de um e de outro tribunal. E a eventual discussão que se travará em torno deste pressuposto processual sê-lo-á em prejuízo da rápida apreciação e consequente decretamento da medida cautelar.». 12.4. Na análise que nos ocupa – a da constitucionalidade do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, interpre- tado no sentido de apenas admitir a arbitragem (necessária) para as providências cautelares no âmbito de litígios sobre direitos de propriedade industrial derivados de patentes de medicamentos de referência em face da comercialização de medicamentos genéricos, sem intervenção de tribunal estadual – com assinaláveis diferenças relativamente ao regime legal da arbitragem voluntária (em que, como vimos, o acesso à justiça estadual não se mostra vedado nos termos da nova Lei da Arbitragem Voluntária) ou mesmo no confronto com outros regimes de arbitragem necessária (é o caso do regime de arbitragem das expropriações, em que a tutela cautelar é confiada ao tribunal estadual competente), a imposição de recurso à arbitragem no domínio das providências cautelares para efeitos de tutela de direitos de propriedade industrial fundados em patentes de medicamentos de referência poderia convocar, prima facie – por força dos apontados limites à justiça arbitral, em particular em matéria de tutela cautelar – algumas reservas quanto à efetivação do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva, consagrado nos n. os 1 e 5 do artigo 20.º da CRP, por parte do titular de um direito de patente sobre medicamento de referência. Todavia, a análise, in casu , da conformidade constitucional da interpretação em causa do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011 – não dispensa a consideração de diversos aspetos que se afiguram relevantes. Desde logo, a natureza do processo de fiscalização de constitucionalidade em causa. Tratando-se de um processo de fiscalização concreta, os poderes de cognição do Tribunal Constitucional encontram-se con- dicionados pela norma (interpretação normativa) do caso concreto, que tenha sido aplicada pelo tribunal recorrido, na decisão proferida sobre o pedido formulado quanto à decretação de concretas providências cautelares, não podendo o juízo sobre a constitucionalidade ir para além dela. Relembre-se, neste ponto, que a interpretação da norma sindicada é perfilhada na decisão recorrida sobre pedido concreto de decretação de providências cautelares dirigidas à recorrida (titular de AIM) – abstenção de fabrico, oferta, armazena- gem, posse ou introdução no mercado, de promoção e divulgação, de medicamentos genéricos, de venda ou cedência a terceiros da AIM (cfr. supra, I, 2).

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=