TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

362 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Para o efeito, será de ter em conta que a equiparação entre os tribunais arbitrais e os tribunais judiciais – sendo tendencial – não é total. Ainda por referência aos tribunais arbitrais voluntários – e não cabendo aqui a opção pela tese contratualista ou pela tese jurisdicional que poderiam fundar a respetiva natureza – escreveu José Lebre de Freitas (“Algumas implicações da natureza da convenção de arbitragem” in Estudos sobre Direito Civil e Direito Processual, vol. II, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 549-566, pp. 549-550): «Atendendo a que aos árbitros cabe, tal como aos juízes dos tribunais do Estado, “dirimir conflitos de interesses privados”, ainda que a convenção de arbitragem os possa dispensar de julgar segundo o direito objetivo (…), a sua atuação é de administração da justiça (artigo 202-2 da Constituição da República Portuguesa) exercida em conformidade com os princípios de fundamentais do processo civil (art. 16.º LAV) e, portanto, de natureza jurisdicional. Mas esta qualificação não põe em causa a constatação de que a fonte do poder jurisdicional é distinta da fonte do poder jurisdicional dos tribunais do Estado dotados de ius imperii que lhes advém da integração na orgânica estadual». Ora, a ausência de poderes de autoridade é também verificada nos tribunais arbitrais necessários. Mesmo que se possa acentuar a natureza publicística da arbitragem necessária – aliás a jurisdicionalização, a progressiva procedimentalização e a atribuição de efeitos à sentença arbitral semelhantes aos de uma sentença judicial são aspetos comuns à arbitragem quer necessária quer voluntária – é consensual não disporem os tribunais arbitrais necessários de poderes de autoridade como dispõem os tribunais estaduais. Daqui também decorre que as decisões dos árbitros têm uma eficácia estritamente inter partes. Deste modo, ainda será de ter em conta que se mostram excluídas (ou, pelo menos, ineficazes) todas as formas de tutela cautelar que tenham efeitos perante terceiros (como a suspensão de deliberações sociais, ao vincular a sociedade), ou produzam efeitos erga omnes. Nas palavras de Armindo Ribeiro Mendes [“As medidas cautelares e o processo arbitral (…)”, cit., p. 91, nota 37], «deve notar-se que o tribunal arbitral nunca tem competência para decretar medidas provisórias contra terceiros». Sendo assim, em tese geral, conclui Paula Costa e Silva, ponderando a realização da Justiça (cautelar) através de tribunais arbitrais: «Aí, o Estado dá-nos, inclusivamente, uma indicação muito forte quanto à não transferência de poderes de autoridade para os juízes arbitrais. Veja-se, neste sentido, o que sucede em sede de competência para a execução das decisões arbitrais: esta foi retirada ao tribunal arbitral. De quanto se disse, pensamos dever reter uma conclusão quanto ao ponto ora em análise: se a ausência de competência executiva não pode ser invocada como argumento contra a arbitrabilidade de pedidos cau- telares em geral, não pode, no que seria o pólo oposto, admitir-se a decretação arbitral de medidas cautelares que impliquem o exercício de poderes de autoridade.» (“A arbitrabilidade das medidas cautelares”, cit. ). 12.2.2. Aos limites assinalados aos poderes dos Tribunais arbitrais acrescem ainda duas ordens de fatores que igualmente podem constituir um óbice à tutela cautelar plena: as especificidades quanto ao seu modus operandi e quanto à sua constituição. Desde logo, o direito da arbitragem português não admite decisões arbitrais ex parte, pelo que se mos- tram excluídas da tutela cautelar as providências cautelares em que não se observe o contraditório. Sendo os princípios da igualdade das partes e do contraditório as bases da justiça arbitral, não podem ser decretadas providências cautelares sem a prévia audição do requerido. Nos termos da nova LAV, as providências caute- lares só podem ser decretadas pelo tribunal arbitral, «(…) a pedido de uma parte e ouvida a parte contrária» (artigo 20.º, n.º 1). A este respeito, é de advertir que nem mesmo a possibilidade de adoção das designadas «ordens preliminares» se afigura passível de inverter a regra do contraditório, dada a sua limitada configura- ção. Como vimos, as decisões tomadas pelos árbitros são proferidas após a audição das partes (com a exceção, aliás muito limitada nos seus pressupostos e efeitos, das ordens preliminares). Assim, e tomando novamente o arresto por exemplo, na medida em que o mesmo é decretado sem audiência prévia do requerido, Mariana França Gouveia explica que «(…) caso se admitisse a competência do tribunal arbitral, o arresto seria decretado através de uma ordem preliminar, ordem que é inexecutável nos

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