TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
351 acórdão n.º 123/15 Europeia no âmbito da garantia do direito de propriedade intelectual, enquanto princípio comum à generalidade dos Estados membros. Já no contexto do sistema jurídico nacional o ponto de vista não pode ser esse, seja na medida em que os direitos de propriedade e de liberdade surgem a par, necessariamente integrados no contexto normativo mais rico e denso do estatuto pessoal de cidadania, seja até porque o direito de patente, enquanto direito fundamental de pro- priedade, surge na Constituição portuguesa com uma proteção mais densa que a liberdade de iniciativa económica, na medida em que está sujeito a menos limitações normativas – circunstância que, para alguma doutrina alemã e nacional, inculca até uma prevalência dos direitos constitucionalmente menos limitados em caso de ponderação, no quadro metódico de resolução de um conflito normativo. Talvez por isso se possa sustentar, entre nós, que, da perspetiva do direito constitucional nacional, ao contrário do que se entende no direito comunitário, a “utilização livre” de uma invenção deva ser encarada como uma res- trição do direito fundamental de autor – que, por isso, só é admissível se e na medida em que for justificada para a salvaguarda de interesses comunitários, estando submetida aos limites constitucionais da adequação, necessidade e proporcionalidade das normas restritivas (...)» (cfr. idem , pp. 72-73). 11.3.3. Em face do que antecede, considera-se que a tutela dos direitos de propriedade industrial deriva- dos de patentes sobre medicamentos de referência, seja pela fundamentalidade dos direitos envolvidos e, bem assim, dos interesses públicos que subjazem aos títulos ou autorizações em que se baseiam, seja pelas impli- cações com os atos administrativos acima referidos, sem prejuízo de não se reportar a matéria exclusivamente reservada aos tribunais estaduais – e assim se admitindo por princípio a respetiva arbitrabilidade – não deixa de convocar algumas garantias a observar no acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva em face da imposição de recurso à arbitragem como mecanismo de tutela desses direitos. Nesta sequência, considera-se caber in casu o entendimento seguido na jurisprudência exarada nos Acór- dãos n. os 230/13 e 781/13, pese embora referida à justiça desportiva, de modo a admitir-se a conformidade constitucional da imposição pelo legislador de um regime de arbitragem (necessária) neste domínio se e enquanto garantida a intervenção de tribunal estadual. Esse entendimento foi assim sintetizado no Acórdão n.º 781/13: «(…) Sobre a atribuição à jurisdição arbitral necessária do Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) de compe- tência para conhecer litígios que têm por objeto atos e omissões das federações e outras entidades desportivas e ligas profissionais, no âmbito do exercício de poderes regulamentares, disciplinares e outros de natureza pública, concedidos por efeito da delegação de poderes efetuada pela atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva e para conhecer dos recursos das deliberações tomadas por órgãos disciplinares das federações desportivas ou pela Autoridade Antidopagem de Portugal em matéria de violação das normas antidopagem (litígios antes sujeitos à jurisdição administrativa), pronunciou-se o Tribunal Constitucional no já referido Acórdão n.º 230/13, aquando da apreciação preventiva da constitucionalidade de norma do Decreto n.º 128/XII. Entendeu o Tribunal Constitucional que «a criação de tribunais arbitrais não pode deixar de se encontrar preordenada a outros princípios constitucionais e, de entre estes, à garantia de acesso aos tribunais e à garantia de reserva de jurisdição» e que a submissão de litígios a uma jurisdição arbitral, como prevê o n.º 2 do artigo 209.º da CRP, «não significa que o recurso a um tribunal estadual não seja ainda a principal via de acesso ao direito e que não possam ser estabelecidos, com base nessa reserva de jurisdição, certos limites à constituição de tribunais arbitrais.» Sublinhou, por outro lado, que embora no domínio do contencioso administrativo a possibilidade de recurso à arbitragem não seja inteiramente estranha aos litígios que envolvam o exercício de poderes de autoridade da Admi- nistração, a solução preconizada na Lei do TAD distingue-se porque prevê “a arbitragem necessária como único meio de resolução dos litígios e não contém qualquer exceção relativamente aos atos administrativos que poderão ser objeto de apreciação em tribunal arbitral, na medida em que abrange todos os atos praticados no exercício de poderes de autoridade, incluindo os atos sancionatórios (…)”.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=