TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

348 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de composição do litígio, ficando os interessados impedidos de aceder quer à jurisdição estadual, quer à arbitragem voluntária. Como se reconheceu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 52/92, tratando-se de um instituto diverso da arbitragem voluntária – que impede as partes de recorrerem, por sua iniciativa, a um tribunal estadual –, a imparcialidade do julgamento, que na arbitragem voluntária se mostra assegurada, em tese, pela livre concertação de vontade vertida no compromisso arbitral, postula aqui um outro tipo de garantias.» Recordando este último aresto: «(…) Não valem neste plano da arbitragem necessária as teses contratualistas de certa doutrina, segundo as quais, o fundamento daauctoritasarbitral residirá na autonomia da vontade das parte s (Guasp, Rocco, Satta). O tribunal arbitral necessário é um instituto distinto, pela sua origem, do tribunal arbitral voluntário; surge em vir- tude de ato legislativo e não como resultado de negócio jurídico de Direito privado. Daí, o seu caráter tipicamente publicístico. Por esse facto, a imparcialidade de julgamento, que na arbitragem voluntária poderia, em tese, mostrar-se assegurada pela livre concertação de vontades vertida no compromisso arbitral postula, aqui, um outro tipo de garantias.». É que a situação que nos ocupa é em grande medida determinada pela imposição da justiça arbitral, não cabendo às partes essa escolha – por resultar de opção feita a montante pelo legislador –, sendo precisamente quanto a essa imposição que se dirigem as reservas formuladas pelas recorrentes na primeira questão de cons- titucionalidade colocada a este Tribunal. Vejamos: A novidade deste regime de tutela jurisdicional dos direitos de propriedade industrial derivados de patentes sobre medicamentos de referência não se prende apenas com a instituição da arbitragem necessá- ria, mas com a específica configuração daquela tutela, pois autonomizada do procedimento administrativo conducente à autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos e, bem assim, do ato admi- nistrativo (patente) em que se fundam aqueles direitos de propriedade industrial. O conflito submetido a arbitragem não é assim dirigido aos atos administrativos necessários à entrada dos medicamentos genéricos no mercado, como a concessão da Autorização de Introdução do Medica- mento (AIM), a aprovação do Preço de Venda ao Público (PVP) ou a decisão de comparticipação no preço do medicamento, regulados no já citado Regime Jurídico dos Medicamentos de Uso Humano (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, alterado pela Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro e pelo Decreto-Lei n.º 128/2013, de 3 de setembro, com a retificação operada pela Declaração de Retificação n.º 47/2013, de 4 de novembro). Como vimos, decorre do novo artigo 23.º-A do RJMUH, aditado tam- bém pela Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro, que o procedimento administrativo destinado à concessão pelo INFARMED, IP, de uma autorização, ou registo, de introdução no mercado de um medicamento de uso humano tem por exclusivo objeto a apreciação da qualidade, segurança e eficácia do medicamento, excluindo-se expressamente do respetivo objeto a apreciação da existência de eventuais direitos de proprie- dade industrial. Por outro lado, a validade da patente – também este um ato administrativo – é reservada por lei aos tribunais judiciais. Dispõe o artigo 35.º, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial (aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de março, com as últimas alterações dadas pela Lei n.º 46/2011, de 24 de junho) que a (respetiva) declaração de nulidade ou a anulação só podem resultar de decisão judicial. Não se pode porém ignorar que o conflito submetido a arbitragem – o meio de tutela facultado pela lei ao titular de direitos de propriedade industrial fundados em patentes de medicamentos de referência em face da pretensão de terceiros de introdução no mercado de medicamento genérico –, pese embora a

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=