TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
344 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL estabelece que «Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a proteção legal dos direitos de autor»). Na mesma ordem de ideias, entendemos que, em ultima ratio , também decorre deste normativo constitucional a qualificação simultânea dos direitos de propriedade industrial, ou, melhor dizendo, dos direitos de propriedade intelectual ou «espiritual», in totum , como direitos fundamentais de personalidade e como direitos fundamentais de propriedade sobre coisas incorpóreas, sendo certo que, como mais à frente se explicará, esta dúplice natureza emerge agora unificada por força do acolhimento de uma «teoria monista» que postula a consagração constitucional de um direito fundamental autoral « sui generis englobador de elementos jurídicos-pessoais e de elementos jurídico-patrimoniais» 32 ( 32 Cfr. José Joaquim Gomes Canotilho. Liberdade e Exclusivo na Constituição. cit., loc. cit. p. 221. Vide infra , 1.4. Aludindo à convergência dos direitos de propriedade intelectual. cfr. Kur in Schrickerl Dreierl Kur (org.). Geistiges Eigentum im Dienst der lnnovation, 2001. p. 23: Derclaye/ Leistner, Intellectual Property Overlaps – A European Perspetive , 2010), como parte integrante do conteúdo essencial da liberdade fundamental de criação cultural. Nesta linha, o fundamento último ou «radical» da dupla dimensão, «moral» e «patrimonial», caracterizadora do objeto de todos os direitos de propriedade intelectual, sejam eles direitos de propriedade industrial tout court , sejam direitos de autor em sentido estrito, rectius , que integra o objeto do «direito de troncalidade autoral», mergulha as suas raízes mais profundas no extenso e multifacetado conteúdo desta liberdade constitucionalmente consagrada. Isto, sem prejuízo de, como adiante se dirá, sempre existir a possibilidade de ancorar a sua fundamentalidade jurídico-constitucional no direito fundamental de propriedade privada, contemplado no artigo 62.º da Lei Fundamental Portuguesa 33 . ( 33 Desde logo, porque no centro nevrálgico desta temática jus-fundamental, para além da «liberdade de criação intelectual, artística e científica», está presente indubitavelmente a “liberdade inerente à propriedade intelectual», E a verdade é que alguma «doutrina constitucional inclui no âmbito normativo dos direitos de propriedade “propriedade espi- ritual” ou “propriedade intelectual’ de forma a alargar o âmbito de proteção deste direito aos direitos de autor, às marcas e às patentes». Ibidem, pp. 219-220)». Ora, assim enquadrados os direitos fundamentais em presença, do que se trata nos presentes autos de fiscalização concreta é da respetiva tutela jurisdicional, já que o fim último desta é a tutela dos direitos invo- cados. Nesses termos, a suscitação da ofensa destes direitos fundamentais – e, bem assim, do regime que lhes está associado, por conjugação dos também invocados artigos 17.º e 18.º da Constituição – afigura-se rele- vante (mesmo que de forma indireta), na medida em que se reconhece derivar da Constituição a obrigação para o legislador de criação dos meios de tutela adequados e eficazes, desde logo jurisdicionais, para a respe- tiva defesa, mesmo que isoladamente considerados possam não constituir parâmetros normativos autónomos para aferir da validade constitucional das normas (interpretações normativas) em causa nos presentes autos. 11.3. Aqui chegados, a análise das questões de constitucionalidade suscitadas centra-se na verificação do respeito pelo direito de acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 20.º, n.º 1, da CRP) e pelo direito a uma tutela jurisdicional efetiva, reportada ao artigo 20.º, n.º 5, também da CRP. Tendo presente a previsão constitucional dos direitos citados, pois assegura a Constituição a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, de modo a obter uma tutela efetiva contra ameaças ou violações desses direitos (artigo 20.º, n. os 1 e 5, da CRP), não releva especialmente a chamada à colação do artigo 268.º, n.º 4, já que a garantia aos administrados de uma tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer atos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de atos administrativos legalmente devidos e a adoção de medidas cautelares adequadas não é mais do que a concretização daqueles direitos no plano da jurisdição administrativa.
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