TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
343 acórdão n.º 123/15 imediatamente uma «valorização económica» e um direito à publicação do produto da criação cultural, mas é evidente que a sua utilização (para fins comerciais, industriais, publicitários, pedagógicos, etc.) cria um valor económico que cai também no âmbito de proteção do direito à criação cultural. De resto, o direito de propriedade intelectual, diretamente protegido pelo regime dos direitos, liberdades e garantias goza de uma proteção constitucional mais intensa do que o direito de propriedade sobre as coisas (art. 62.º)» (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada , Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, 2007, p. 622), tese, aliás, já acolhida neste Tribunal (cfr. Acórdão n.º 577/11): «(…) O bem jurídico tutelado por esta incriminação reside nosdireitos de autor, os quais se apresentam como valores constitucionalmente relevantes, nos termos dos artigos 42.º, n.º 2 e 62.º da Constituição. A tutela da pro- priedade intelectual apresenta-se, no plano da nossa Constituição, como uma tutela multifacetada. Com efeito, a propriedade intelectual é, antes de mais,propriedadeprivada, abrangida, portanto, no núcleo essencial do direito fundamental de propriedade, nos termos do artigo 62.º, n.º 1, da Constituição (nesse sentido se pronunciou já o Tribunal no acórdão n.º 491/2002, publicado no Diário da República , II série, de 22 de janeiro de 2003). Mas a tutela dos direitos de autor não se consome na proteção que o Estado concede à propriedade. A Cons- tituição estabelece, no capítulo II do Título respeitante aos direitos, liberdades e garantias, sob a epígrafe “direitos, liberdades e garantiaspessoais”, que a liberdade de criação cultural inclui aproteção legal dos direitos de autor. A propriedade intelectual surge, assim, integrada no âmbito do regime específico dos direitos, liberdades e garantias, beneficiando, portanto, de uma tutela mais intensa do que a que, em primeira linha, a Constituição reserva aos direitos económicos, sociais e culturais, enquadrados no Título III (ressalvando-se as devidas equiparações no caso dos direitos análogos, nos termos do artigo 17.º).(…)». Ora, mesmo não se configurando formalmente os direitos em presença como «direitos de autor», certo é que as patentes são direitos (exclusivos) que se obtêm sobre invenções (soluções novas para problemas téc- nicos específicos), quer se trate de produtos ou processos (e aqui se incluindo os processos novos de obtenção de produtos, substâncias ou composições já conhecidos), pelo que, em grande medida, a patente corresponde à tutela dessa invenção. Assim, é de admitir, na perspetiva da respetiva tutela jurídico-constitucional, o con- curso de direitos de criação cultural (científica), consagrados no artigo 42.º da Constituição. Acompanha-se aqui a reflexão de Gomes Canotilho (cfr. Parecer sobre o Novo Regime Legal de Resolução de Litígios Patentários , policopiado, fls. 25-26): «Como princípio geral, pode, pois, dizer-se que o “direito à patente”, isto é, o direito “a requerer a patente”, pertence ao “criador intelectual ou aos seus sucessores”, sendo que é naquele preceito que se determina «quem está legitimado a solicitar um pedido de patente de invenção em seu nome, vindo a figurar no pedido de registo como requerente do direito» 29 ( 29 Cfr. António Campinas e Luís Couto Gonçalves. Código da Propriedade Industrial. cit., pp. 215. e segs.). Em nosso entender, o «inventor» encontra-se legitimado ab initio , mesmo do ponto de vista jurídico-constitucional, para requerer a patente que lhe irá conferir o «exclusivo» do direito. Legitimação que lhe advém do fato de já lhe assistir um direito, concomitantemente pessoal e patrimonial, sobre a própria «invenção». O mesmo será dizer, em virtude de ser titular do «direito de troncalidade autoral», tendencialmente unificador do conteúdo essencial da Liberdade fundamental de criação cultural, constitucionalmente consagrada e que o legislador ordinário acabou por «dispersar» em sede de concretização sistemática-normativa 30 ( 30 Cfr. José Joaquim Gomes Canotilho, “Liberdade e Exclusivo na Constituição”, in Estudos sobre Direitos Fundamentais, Almedina. Coimbra Editora, 2004, pp. 219 e segs.) Este princípio geral conformador do direito de «invenção» a patentear apresenta-se, no plano da lei ordinária, como uma manifestação ou corolário do direito/liberdade fundamental pes- soal de «criação cultural» – criação cultural, artística e científica – , consagrado no artigo 42.º da Constituição da República Portuguesa 31 ( 31 Convém lembrar desde já, que, nos termos do n.º 1 do artigo 42.º da Constituição da República Portuguesa. «É livre a criação intelectual, artística e científica». Por seu turno, o n.º 2 do mesmo artigo
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