TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
324 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL XII – É que sendo o recurso à justiça arbitral – neste caso necessária – limitado a um período temporal de trinta dias, coincidente com a primeira fase do procedimento administrativo de concessão de AIM ou, pelo menos, sempre anterior à conclusão desse procedimento – e que é iniciado a partir da publi- citação na página eletrónica do INFARMED de pedido de autorização de introdução no mercado de um medicamento genérico –, verifica-se que o modo como o legislador configurou o tempo quanto ao recurso à arbitragem necessária convoca a ponderação de vários fatores que podem conduzir a um juízo de desproporção na afetação do direito de acesso à justiça na perspetiva do titular do direito de patente e face a outros direitos envolvidos e valores prosseguidos pelo legislador. XIII – Desde logo, não sendo prevista qualquer forma de notificação ou informação aos interessados (titula- res de direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência), para além da publi- citação virtual dos pedidos de AIM de medicamentos genéricos onde consta a indicação do medica- mento de referência, que garanta o conhecimento efetivo do termo inicial do prazo para recurso à arbitragem, o modo de conhecimento do termo inicial daquele prazo – coincidente com a referida publicitação eletrónica – configura um ónus excessivo para o detentor do direito de patente no que respeita ao acesso à tutela jurisdicional; além disso, afigura-se determinante a própria insuficiência do prazo – trinta dias – face, por um lado, à escassez de informação na disponibilidade do titular do direito de patente no momento em que, por imposição legal, deve recorrer à arbitragem necessária, e, por outro, à complexidade da matéria em causa; de facto, os constrangimentos quanto à informação disponível não podem deixar de ser ponderados, enquanto elemento suscetível de afetar o direito de tutela jurisdicional dos direitos derivados de patentes, seja no seu exercício seja na sua utilidade. XIV– A especial onerosidade imposta ao detentor do direito de patente quanto ao conhecimento efetivo do termo inicial do prazo para recurso à arbitragem, bem como a insuficiência do prazo concedido para efeitos de recurso à justiça arbitral para tutela dos direitos de propriedade industrial invocados pelos detentores de patente do medicamento de referência, face à escassez de informação e à complexidade da matéria, consubstancia uma restrição desrazoável e desproporcionada do direito de acesso aos tri- bunais e a uma tutela jurisdicional efetiva dos direitos de propriedade intelectual não consentida pelo artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. XV – Decorrendo da interpretação subjacente à decisão recorrida que o decurso do prazo acarreta a impossi- bilidade (definitiva) do exercício do direito (fundamental) de acesso à justiça para proteção do direito de patente relativo a medicamentos de referência face ao fabrico e comercialização de medicamento genérico por terceiro (não autorizado), e não obstante os interesses invocados pelo legislador – de celeridade enquanto meio para alcançar uma mais rápida introdução de medicamentos genéricos no mercado em prol do consumidor e com menor onerosidade para estes e para o próprio Estado – se afigurarem muito relevantes, o modo escolhido para os prosseguir encerra a desproteção, desde logo em termos de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, de um direito jusfundamental para além do momento temporal fixado para o efeito pelo regime legal em causa. XVI – Com efeito, o caráter definitivo da impossibilidade de tutela dos direitos de patente (tutelados por período de vinte anos), decorrido o prazo de trinta dias contado da publicitação eletrónica dos ele- mentos relativos a um pedido de concessão de AIM, não se compadece com a fundamentalidade dos direitos envolvidos, assim se concluindo pela violação do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva.
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