TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
295 acórdão n.º 122/15 161. Na verdade, é virtualmente impossível ocorrer a prescrição de uma dívida tributária, uma vez que: – se for prestada garantia, como o prazo de prescrição está interrompido até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo, no final desse processo a garantia será executada; – se não for prestada garantia, o processo segue para penhora e, após trânsito em julgado da decisão desfavo- rável que ponha termo ao processo, para venda do bem penhorado. 162. Seja como for, o resultado é invariavelmente o mesmo: a imprescritibilidade da obrigação tributária, já que o trânsito de decisão judicial de improcedência de impugnação judicial acarreta sempre e necessariamente o imediato pagamento, voluntário ou coercivo, de dívida tributária – cujo prazo prescricional só então se inicia … 163. Com efeito, no entendimento do douto Acórdão recorrido, a prescrição jamais ocorre, de acordo com o seguinte silogismo: – Se a execução fiscal prossegue a sua tramitação depois do trânsito em julgado da decisão de improcedência da impugnação judicial, – Se aquela execução fiscal só termina com o pagamento, e; – Se todo o prazo de prescrição se reinicia apenas com aquele trânsito em julgado, – Então a prescrição só seria passível de ocorrer depois da ocorrência do pagamento da dívida exequenda (!). 164. Ora, como se sabe, tal facto é legalmente impossível: uma vez paga a dívida tributária, passa a ser legal- mente impossível e, por isso, inútil, invocar a sua prescrição. 165. Repare-se no caso vertente: apesar de estarmos quase em 2014, e da dívida se reportar a 1997 e 1999, segundo o entendimento do douto Acórdão recorrido o prazo de prescrição ainda nem sequer se iniciou, pois ainda não cessou o processo de execução fiscal. 166. Aliás, há muito que decorreu o próprio prazo legal de 10 anos, de arquivo dos documentos e registos contabilísticos (cfr. artigos 40.º do Código Comercial e 115.º n.º 5 do CIRC). 167. O que pode colocar sérios problemas a muitos contribuintes que porventura sejam confrontados com cobranças de tributos num momento em que já não dispõem, nem têm obrigação de dispor, da respetiva documen- tação de suporte, designadamente dos respetivos comprovativos de pagamento. 168. Os crimes prescrevem em prazos razoáveis, enquanto as dívidas tributárias jamais prescrevem – o que significa que o valor dos créditos tributários se sobrepõe às necessidades de segurança geral e especial e de repressão da violação de valores como a vida. 169. Poder-se-ia dizer que o artigo 49.º n.º 2 da LGT, redação em questão, na medida em que estipulava o reinicio do prazo de prescrição assim que o processo completasse um ano de paragem, por motivo não imputável ao contribuinte, atenuaria este adiamento eterno da verificação da prescrição. 170. Contudo, na prática não é isso que se verifica, de que é caso sintomático o dos autos – ficou provado que o processo de impugnação judicial (que antecedeu o processo de execução fiscal) esteve parado por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte, e apesar disso o prazo de prescrição ainda nem sequer se iniciou, segundo o douto Acórdão recorrido, já que o processo de execução fiscal ainda não findou. 171. Com efeito, o contribuinte não poder ser prejudicado por anos a fio, senão décadas, de atraso na resolução final dos processos judiciais. 172. De facto, não faz qualquer sentido considerar que a prescrição apenas se inicia depois de extinto o pro- cesso de execução fiscal – extinção, essa, que apenas ocorre após pagamento da dívida exequenda. 173. Nesse entendimento, de facto, a prescrição dos créditos tributários jamais ocorre, seja em que circuns- tância for – o que, obviamente, é sintomático da incorreta interpretação da lei, já que esta prevê, efetivamente, a prescrição dos créditos tributários. 174. Se assim não se entender, então mais vale banir da lei, de uma vez por todas, o “artifício” da prescrição das dívidas tributárias, já que esta, na prática, e segundo semelhante entendimento, jamais ocorreria, ao contrário do que sucede, por exemplo, com os crimes de sangue, efetivamente sujeitos a “uma prescrição” que pode efetivamente suceder.
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