TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
290 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 88. O que tem uma importante consequência, igualmente fundamentadora da necessária diferença entre as regras da prescrição no caso dos créditos tributários e no caso dos créditos civis: se no caso dos créditos civis se pode admitir a inércia do credor em prover à sua cobrança efectiva, já o mesmo não pode suceder no caso dos créditos tributários. 89. Daí uma razão para a profunda diferença dos regimes legais da prescrição dos créditos civis e dos créditos tributários. 90. Como, aliás, se denota do acima referido: contrariamente ao credor civil, que tem de aguardar por uma decisão judicial condenatória do devedor, com trânsito em julgado, para poder executar, se quiser, o património do devedor cível. 91. O credor tributário beneficia, desde logo, da imediata instauração do processo de execução fiscal, por força da lei, e de forma totalmente irrenunciável, assim que transcorrido o prazo de pagamento voluntário da liquidação exequenda. 92. Destas diferenças fundamentais entre créditos civis e créditos tributários advém que os respetivos prazos de prescrição jamais se possam contar do mesmo modo – se no caso dos créditos civis se justifica que os prazos de prescrição só se iniciem no momento do trânsito em julgado da decisão que pôs termo à lide contra o devedor cível, já no caso dos créditos tributários, dado que a execução fiscal é de imediato instaurada, antes mesmo da impugna- ção judicial, nada justifica que a prescrição só se inicie com o trânsito em julgado da impugnação judicial ou com o final do processo de execução fiscal. 93. E precisamente por isso é que, nos casos dos créditos tributários, diferentemente dos créditos civis, se justifica particular cuidado com a proteção da confiança e legítimas expectativas dos contribuintes, atenta aquela posição de autêntico ius imperium de que goza o credor tributário, considerada a natureza de interesse público desses mesmos créditos. 94. De facto, razões elementares de segurança jurídica justificam que o devedor tributário seja especialmente protegido contra o abuso da “posição dominante” do credor tributário, atenta a relação de direito público esta- belecida entre as partes, contrariamente ao equilíbrio interpartes reinante na esfera das relações jurídico-civis, de direito privado comum. 95. E essas especiais necessidades de certeza e estabilidade em direito tributário, como condição de proteção da confiança e legítimas expectativas dos contribuintes, não se compadecem com a cobrança de impostos cujos pressupostos, ou cujo vencimento, se situem em épocas muito remotas. 96. Essa necessidade de segurança e estabilidade jurídica justifica-se, quer na necessidade de proteger a relação de confiança entre o contribuinte e o credor tributário, no sentido de que aquele não será mais incomodado com dívidas fiscais passado um determinado número de anos, minimamente razoável e proporcionado ao state of the art da tramitação procedimental e processual, 97. Quer na esfera das relações que o contribuinte, por sua vez, estabelece com terceiros, designadamente com clientes, fornecedores, acionistas, etc., na medida em que o prolongamento indefinido da discussão da legalidade da dívida exequenda pode influir na confiança de todos aqueles que tenham relações económicas com o contribuinte, dado estar em questão uma potencial responsabilidade que se pode manter anos a fio – tanto mais gravosa, aliás, quanto mais demorado for o encerramento do contencioso em que se discute a legalidade da dívida exequenda, pelo decurso de juros de mora e de encargos com o processo, com advogados, com a garantia pendente, etc., etc.. 98. Inclusivamente, no preâmbulo do DL 398/98, de 17/12, que aprovou a LGT, apontou-se para uma «maior segurança das relações entre a administração tributária e os contribuintes, a uniformização dos critérios de aplica- ção do direito tributário, de que depende a aplicação efetiva do princípio da igualdade, e a estabilidade e coerência do sistema tributário», bem como para «o encurtamento pontual ou genérico dos prazos de caducidade do direito de liquidação e de prescrição das obrigações tributárias». 99. De facto, a ratio legis que subjaz, designadamente, ao artigo 49.º da LGT, jamais pode conduzir a interpre- tações como aquela segundo a qual o prazo de prescrição apenas se inicia com o trânsito em julgado da impugnação
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