TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
285 acórdão n.º 122/15 10. Extinguindo-se o direito de exigir o pagamento da dívida de imposto, a prescrição incide sobre um aspeto essencial da relação jurídica tributária, sendo generalizado, na Doutrina, o entendimento de que o respetivo regime consubstancia uma garantia material dos contribuintes. 11. A ser assim, como é, trata-se, indubitavelmente, de matéria sujeita a reserva de lei parlamentar. 12. De resto, o próprio Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a inclusão no âmbito da reserva de lei parlamentar de matéria que, para este efeito, pode ser equiparada à prescrição, porque os interesses em conflito são os mesmos – que é a matéria da caducidade do direito à liquidação – cfr. Acórdão do TC n.º 168/02, publicado no Diário da República , II Série, de 01.06.2002. 13. Na verdade, ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja cobrança não se faça nos termos da lei (cfr. artigo 103.º n.º 3 da CRP), 14. e sendo a finalidade das garantias dos contribuintes, precisamente, protege-los contra pretensões de liqui- dação e cobrança de tributos fora das condições previstas na lei, tem de concluir-se, forçosamente, que respeitam às garantias dos contribuintes as normas de que resulte, para os mesmos, a extinção do dever de pagamento de tributos. 15. Consequentemente, a sua regulação exige lei parlamentar ou decreto-lei autorizado. 16. Não é possível considerar, como considerou o douto Acórdão recorrido, que, por aplicação do disposto no artigo 327.º n.º 1 do Código Civil, o artigo 49.º da LGT, na redacção em causa, deve ser interpretado no sentido de que o prazo de prescrição reinicia a sua contagem apenas partir do fim do processo de execução fiscal (ou a partir do trânsito em julgado da decisão proferida sobre a Impugnação Judicial). 17. Nem a letra do disposto no artigo 49.º da LGT, nem qualquer outro normativo tributário, permitem semelhante interpretação. 18. Com efeito, em lugar algum do direito tributário, tão pouco no artigo 49.º da LGT, se afirma que, no caso de impugnação judicial e subsequente citação para o processo de execução fiscal, o reinício in totum do prazo de prescrição ocorre apenas a partir do fim do último dos processos interruptivos da prescrição. 19. Sendo certo que, nos termos do artigo 9.º n.º 2 do CC, ex vi do artigo 11.º n.º 1 da LGT, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência. 20. Sobre questões de “suspensão” do prazo de prescrição, regia, à data, o n.º 3 do artigo 49.º da LGT (redação anterior à da Lei n.º 53-A/2006, de 29.12) – que constituía, assim, “norma especial quanto à suspensão do prazo de prescrição” e, por isso, prevalecente e aglutinadora do respetivo regime legal (cfr. artigo 7.º n.º 3 do CC). 21. E daí não se extraía o reinício do prazo de prescrição a partir do fim do processo de execução fiscal. 22. Sem prejuízo, diga-se que o artigo 326.º n.º 1 do CC é claro ao afirmar que a a interrupção (da prescrição) inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo – in casu , o acto de apresentação de impugnação judicial, em 28.02.2002. 23. Por força do princípio da legalidade consagrado no n.º 2 do artigo 103.º da CRP, complementado com o disposto no artigo 11.º n.º 4 da LGT, é constitucionalmente inadmissível invocar o disposto no artigo 327.º n.º 1 do Código Civil, como fez o Tribunal a quo. 24. uma vez que, em matéria de garantias dos contribuintes – como é o caso da prescrição das obrigações tri- butárias – está legalmente vedada a aplicação de normas de outros ramos de Direito, designadamente de normas de direito civil ou direito privado comum, quando o direito tributário regula na íntegra, de forma especial, a matéria em questão, abrangida pelo princípio constitucional da legalidade. 25. Aliás, sempre estariam em causa obrigações jurídicas e ramos de direito completamente distintos – o direito fiscal, ramo de direito público, e o direito civil, ramo de direito privado – com normativos, objectos de regulação e ratios completamente distintas. 26. pelo que sempre faleceria a exigência do confronto de “situações análogas”, ou mesmo a coincidência de “razões justificativas” de regulamentação (cfr. artigo 10.º n.º 1 e 2 do CC). 27. Sendo certo que dispõe o n.º 4 do artigo 11.º da LGT que as lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são suscetíveis de integração analógica.
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