TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
278 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A inconstitucionalidade da norma sindicada por afronta ao princípio do arquivo aberto torna inútil a apreciação do mesmo vício em face do direito instrumental à informação derivado do direito dos adminis- trados à tutela jurisdicional dos n. os 4 e 5 do artigo 268.º da CRP. III – Decisão Nos termos em pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Julgar inconstitucional, por violação das disposições conjugadas do n.º 2 do artigo 268.º e do n.º 2 do artigo 18.º da CRP, a norma da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 46/2007, de 24 de agosto, interpretada no sentido de abranger apenas as empresas públicas que emergem diretamente do Estado, com exclusão das empresas do setor público criadas por empresas públicas. b) Conceder, em consequência, provimento ao recurso, devendo o acórdão recorrido ser reformado de acordo com o presente juízo de inconstitucionalidade. Lisboa, 12 de fevereiro de 2015. – Lino Rodrigues Ribeiro – Carlos Fernandes Cadilha (com declaração) – Catarina Sarmento e Castro – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei a decisão apenas na medida em que a interpretação normativa sindicada implicava uma exclusão genérica do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos em relação a empresas públicas detidas por outras empresas públicas, com base numa distinção – que se afigura não ter fundamento legal – entre empresas em que o Estado (ou outras entidades públicas) exerçam, direta ou indiretamente, uma influência dominante. Mantenho, no entanto, as objeções que manifestei no voto de vencido aposto no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 496/10, que analisava a constitucionalidade da norma extraída do artigo 4.º, n.º 1, alínea d) , da Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto, quando interpretada no sentido de garantir a todos os cidadãos o acesso a documentos das empresas públicas constituídas sob a forma societária que tenham por objeto a ges- tão e alienação do património imobiliário, em termos de considerar essa solução como constitucionalmente permitida. Considero que as empresas públicas puramente concorrenciais, que exercem uma atividade privada e se encontram no mercado em situação equiparada à de outras empresas concorrentes do setor privado, enquanto empresas privadas de mão pública, apenas poderão encontrar-se subordinadas aos princípios da atividade administrativa, entendidos estes como limites negativos de atuação ou parâmetros de juridicidade, e não como critérios diretos de atuação. E nesse sentido é exigível, por exemplo, que aos respetivos órgãos dirigentes se torne extensivo o regime de impedimentos do CPA (por respeito ao princípio da imparciali- dade) ou o critério de tratamento igualitário dos particulares (por respeito ao princípio da igualdade), mas não já o dever de decisão (artigo 9.º do CPA) ou o dever de fundamentação das decisões (artigo 124.º do CPA), ou ainda o dever de informação sobre documentos que tenham em seu poder, por efeito do exercício da sua atividade, e que provêm apenas da prática de atos correntes de gestão privada. Uma medida legislativa que, para efeito do acesso à informação, confira relevo apenas ao facto de se tratar de empresas do setor público, desconsiderando que atuam como meros operadores económicos, coloca essas empresas numa situação de discriminação e efetiva desigualdade perante as empresas privadas concor- rentes, o que representa, em si, um desvio ao princípio da eficiência do setor público e da equiparação entre empresas dos setores público e privado que intervenham na mesma área de atividade, que estão pressupostos nas normas dos artigos 80.º, alínea c) , e 81.º, alínea c) , da Constituição.
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