TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
275 acórdão n.º 117/15 Por conseguinte, há domínios não referidos no n.º 2 no artigo 268.º que podem conflituar com o direito de acesso, como é o caso dos documentos que contenham informação sobre a vida económica das empre- sas ou relacionada com direitos de propriedade intelectual ou industrial e respetivos segredos comerciais e industriais. Estes interesses económicos, protegidos em várias normas constitucionais [cfr. artigos 42.º, 61.º, n.º 1, 62.º, 80.º, alínea c) , 81.º, alínea f ) ] podem justificar a prevalência do secretismo de certa categoria de documentos, em termos que permitam o controlo da sua razoabilidade. Todavia, como refere Gomes Cano- tilho, «uma eventual relação de prevalência só em face das circunstâncias concretas e depois de um juízo de ponderação se poderá determinar, pois só nessas condições é legítimo dizer que um direito tem mais peso do que outro» (cfr. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 5.ª edição, p. 1256). Por se considerar que esse juízo de ponderação foi efetuado por via legislativa, segundo um critério de proporcionalidade, o Tribunal Constitucional julgou não desconforme com o princípio do arquivo aberto as normas do artigo 62.º do Código do Procedimento Administrativo e do artigo 10.º da Lei n.º 63/93, de 26 de agosto (primitiva LADA) que não admitem o acesso a documentos que revelem segredos comerciais, industriais ou autorais ou sobre a vida interna das empresas (Acórdãos n. os 254/99, 335/99, 384/99, 385/99, 386/99 e 136/05). No caso das empresas públicas de formato societário, que atuam em ambiente de mercado, o princípio do arquivo aberto confronta-se com o princípio da concorrência consagrado na alínea f ) , do artigo 81.º da CRP. A garantia da equilibrada concorrência entre empresas refere-se também às empresas do setor público empresarial, impedindo que sejam favorecidas ou prejudicadas em relação às demais empresas que atuam no mercado. Perante esse princípio constitucional pode questionar-se se a sujeição das empresas públicas concorrenciais ao dever de acesso não constitui concorrência desleal, suscetível de prejudicar os legítimos interesses dessas empresas. A essas questão, o Tribunal Constitucional já respondeu no Acórdão n.º 496/10 que «não pode retirar- -se do princípio da concorrência, isolado ou conjugadamente com a garantia da coexistência dos setores, uma imposição de igualitarização necessária de condições de funcionamento e organização das entidades empresariais públicas que prevaleça sobre outros princípios a que, pela sua dupla natureza – de interveniente no mercado e de instrumento do ente público instituidor para prosseguir interesses da coletividade nacional postos pela lei a seu cargo, mediante a mobilização de fundos públicos –, devam ficar sujeitas, de modo tal que, em maximização daquele princípio, não lhe pudessem ser impostas obrigações ou deveres inerentes ou justificáveis pelo seu caráter público. Um desses ónus ou servidões, inerentes à natureza pública das tarefas prosseguidas ou dos meios envolvidos, é o que decorre do princípio da transparência administrativa que pode justificar que a empresa pública seja colocada, quanto à reserva de informação em seu poder, em termos menos favoráveis de intervenção no mercado do que os seus concorrentes». E conclui-se nesse Acórdão que se deve entender que o «princípio da concorrência não é absoluto, tendo de ser compatibilizado com outros princípios ou valores constitucionais, de modo algum podendo extrair-se dele um imperativo de igualização em função do qual seja constitucionalmente vedado sujeitar as empresas do setor público que atuam em ambiente de mercado a um regime de information disclosure que não seja aplicável às empresas concorrentes, mas que tem justificação na sua ligação organizativa, funcional ou mate- rial à Administração Pública em sentido estrito. A adoção de formas de direito privado não afasta o caráter público do substrato financeiro e patrimonial dessas entidades e o caráter público da atividade que desempe- nham e dos meios de que se servem ou comprometem. Como diz Pedro Gonçalves ( loc. cit., p. 10) “o acesso à informação das empresas do setor público revela-se um dos domínios em que se justificam desvios que atendam precisamente ao facto de se tratar de empresas que, mesmo atuando em ambiente de mercado – e nem sempre este é o caso –, não são empresas como as outras (do setor privado), pois pertencem aos poderes públicos e desenvolvem uma ação que é ação pública, que se funda numa competência e não na liberdade”». Todavia, o facto de não se aceitar a prevalência sistemática do princípio da concorrência sobre o princí- pio do arquivo aberto, dado estar em causa uma empresa do setor público, isso não significa que o interesse
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