TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

274 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL âmbito das entidades abrangidas, mas em termos de admitir o condicionamento do acesso a certo tipo de documentos, destinados a proteger a capacidade económica e a competitividade das empresas em causa» (cfr. “Os Direitos Fundamentais dos Administrados após a Revisão Constitucional de 1989”, in Revista Direito e Justiça, Vol. VI., 1992, p. 307). A proteção dos interesses constitucionalmente relevantes das empresas do setor público que atuam em ambiente de mercado é feita através de restrições ou condicionamentos no acesso a determinados tipo de documentos e não através da exclusão genérica do âmbito subjetivo de incidência do dever de acesso. No n.º 2 do artigo 268.º da CRP, o direito de acesso aos registos e arquivos administrativos é a regra e não a exceção. Na verdade, «com as ressalvas legais em matérias de segurança interna e externa, investigação crimi- nal e intimidade das pessoas (n.º 2, in fine ), a Constituição torna claro que a liberdade de acesso é a regra, sendo os registos e arquivos um património aberto da coletividade» (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. Vol. II., p. 824). A consagração da transparência e da publicidade como regra não exclui a existência de áreas de exercício do direito em que se justifica o segredo para proteção de determinados valores com assento constitucional. O direito de acesso aos arquivos e registos administrativos não é um direito absoluto ou ilimitado, uma vez que, mediante expressa autorização constitucional, está sujeito aos limites que a lei vir a estabelecer em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas. A formulação da reserva de lei para esta «trindade restritiva» não implica, porém, uma prevalência abstrata dos valores aí men- cionados sobre o direito ao acesso. A salvaguarda destes direitos e interesses constitucionalmente protegidos só pode justificar a confidencialidade dos documentos detidos pelas entidades sujeitas ao acesso, desde que não se comprometa o conteúdo essencial do direito e se obedeça a um critério de proporcionalidade (cfr. n.º 2 do artigo 18.º da CRP). De modo que a solução legislativa para este conflito de valores e interesses – o da transparência em que se baseia o arquivo aberto e o da confidencialidade exigida pelos valores da segurança, investigação criminal e intimidade das pessoas – não pode deixar de ser construída através de uma valoração, por meio da qual os valores e interesses contraditórios e conflituantes possam ser otimizados num compromisso que assegure o justo equilíbrio entre eles. Dada a necessidade de se ter em conta as circunstâncias relevantes no caso con- creto, a resolução do conflito por via legislativa implica normalmente uma abertura normativa que assegure a consideração dessas circunstâncias, limitando-se a lei a fixar “critérios de ponderação” que orientem os juízes nos casos concretos [cfr. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais (…) cit, p. 306]. 18 . Para além das restrições expressamente previstas no n.º 2 do artigo 268.º da CRP, a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem admitido que o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos pode sofrer outras restrições impostas pela necessidade de salvaguardar direitos e interesses constitucionalmente protegidos. A consagração constitucional da transparência como regra, empurrando o segredo para o domínio da exceção, não exclui a existência de outras áreas onde se justifique uma intervenção legislativa destinada a resolver, por via geral e abstrata, um conflito entre direitos e valores afirmados por normas e princípios constitucionais. O facto da Constituição consagrar limites expressos não implica que nenhum outro limite seja admitido. É que, qualquer que seja o âmbito e intensidade de proteção de um direito na Constituição, podem existir limites que resultam simplesmente da existência de outros direitos e bens, igualmente reco- nhecidos na Constituição e que em certas circunstâncias com eles conflituam. Como se refere no Acórdão n.º 254/99, «o n.º 2 do artigo 268.º implica que em matérias que não sejam relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, o direito de acesso aos arquivos e registos admi- nistrativos não tem à partida ( prima facie , a priori ) os limites que resultam da lei nestas matérias. Nessas outras matérias apenas pode ter a posteriori os limites que resultam da solução constitucional das situações de conflito com outros bens ou interesses constitucionalmente protegidos».

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